segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Fantasias e realidade no Centro Espírita


Por Éder Fávaro

Abrindo o livro dos Médiuns, deparamos logo de início, na sua introdução, com a afirmativa de Kardec sobre as dificuldades e desilusões encontradas na prática espírita, que decorrem da ignorância dos princípios doutrinários. Mais adiante, ele continua fazendo observações importantes, tais como: "A prática espírita é difícil, apresentando escolhos que somente um estudo sério e completo pode prevenir". Experiências feitas com leviandade, sem conhecimento de causa, provocam péssima impressão nos principiantes ou pessoas mal preparadas, tendo o inconveniente de dar uma idéia bastante falsa do mundo dos espíritos, favorecendo a zombaria e dando motivos a críticas quase sempre bem fundadas. É por isso que os incrédulos saem dessas reuniões raramente convencidos e pouco dispostos a reconhecerem os aspectos sérios do Espiritismo".
É evidente que Kardec não falava só para o seu tempo. Prevendo o progresso do Espiritismo, e o aumento crescente de interesse com relação a ele, alertava sobre a responsabilidade dos dirigentes e médiuns das reuniões espíritas de todos os tempos quanto aos compromissos da preservação e defesa da pureza doutrinária.
Pelo que temos observado em visitas a um número considerável de Centros e através de informações idôneas, a preocupação de Kardec não era sem propósito.
Os desvirtuamentos, as invenções, as infiltrações de idéias e práticas antidoutrinárias são uma realidade em muitas "Casas Espíritas" do nosso Estado, quiçá do Brasil.
Dentre as novidades que nada têm a ver com o Centro Espírita, podemos destacar, muito embora respeitáveis em suas respectivas áreas, a Radiestesia, a Cromoterapia, a TVP e outras, que não devem ser consideradas atividades do Centro.
Há ainda práticas e orientações fantasiosas que não podem e nem devem ser incluídas como propostas da Doutrina Espírita. Elas são frutos da falta de conhecimento, da ignorância e até da irresponsabilidade de dirigentes e colaboradores, muitas vezes mal intencionados, que não visam outra coisa se não o poder, a projeção, o destaque pessoal, colocando seus interesses particulares acima da Causa.
É verdade que existem muitos Centros Espíritas que desenvolvem suas atividades fundamentadas nos norteamentos Kardecistas, com estudos sérios, atendimento fraterno, orientação doutrinária segura, critérios corretos e aplicação da ética espírita em todos os sentidos, mas há inúmeros que se utilizam da denominação "Espírita", estando, no entanto, totalmente distanciados dos postulados da doutrina.
Essa é uma realidade, dela temos que ter conhecimento. Por exemplo: há "Centros Espíritas" que benzem objetos, roupas e fotografias, que se dedicam em pesquisas sobre vidas passadas com objetivos escusos, que fazem revelações sensacionalistas de vidências, provocando desajustes em pessoas psicologicamente despreparadas, que fazem das reuniões mediúnicas um espetáculo, e ainda outros que são dirigidos só por "Missionários", sem contar com outra categoria de "Centros" que caracterizam todos que os procuram como doentes e obsedados. Não bastassem esses, há os que até recebem comunicações de espíritos vindo de outras galáxias, que indicam o uso do defumador para a solução dos problemas humanos, que introduzem hinos em suas reuniões, que realizam batizados e casamentos, e dão às suas reuniões um caráter eminentemente ritualístico.
Esses "Centros", em termos de orientação, acabam extrapolando e entrando no terreno movediço do "Achismo". Respondem sobre tudo sem o mínimo embasamento doutrinário, bom senso e critério. Os seus dirigentes e médiuns, via de regra, transferem a responsabilidade de suas opiniões aos espíritos, afirmando não serem eles os autores das idéias e sim os mentores. São pródigos nos aconselhamentos e orientações estapafúrdias e pueris, que conduzem as criaturas a uma visão errônea a respeito dos fundamentos e ensinamentos do Espiritismo, provocando com isso, em alguns casos, processos de perturbação e obsessão.
É o ressurgimento da mágica, do mistério, da fantasia, do maravilhoso e do sobrenatural, contrastando diametralmente com a visão espírita a respeito dos fatos. Kardec ainda no Livro dos Médiuns, cap. II, observa que "o Espiritismo não aceita todos os fatos considerados maravilhosos. Longe disso, demonstra a impossibilidade de muitos deles e o ridículo de algumas crenças que constituem, propriamente falando, a superstição".
Até no campo da administração do Centro Espírita encontramos casos absurdos em que os espíritos, através de "médiuns confiáveis do grupo", elaboram chapas de eleição para a direção da entidade, atestando a incompetência dos encarnados para dirigirem a obra.
Para reforçar o nosso enfoque, passamos a relatar alguns casos, dentre outros tantos que tivemos a oportunidade de vivenciar ou conhecer. Retratam o triste quadro do mediunismo introduzido como sendo prática mediúnica à luz da metodologia espírita. Na realidade, são verdadeiros focos de mistificações que só retardam o progresso e o crescimento espiritual de seus participantes - médiuns, dirigentes e assistentes:
Um médium que conhecemos trabalhava numa Casa Espírita, dedicando algumas horas de trabalho em reunião de desobsessão. Premido pelas circunstâncias, necessitou reduzir a sua atividade doutrinária no grupo. Recebeu, por isso, advertência do dirigente do trabalho, de que estava sendo envolvido por atuação dos espíritos das trevas, tornando-se, assim, candidato a uma grave obsessão.
Será essa a atitude de espíritos responsáveis que dirigem reuniões sérias?
O presidente de uma Casa Espírita, onde fomos recebido, afirmou certa feita, que o seu grupo tinha ligação com a Espiritualidade superior através de um canal de luz, que descia das alturas e vinha até o meio da sala do "seu" Centro, por onde desciam e subiam espíritos superiores, achando que esse era o único canal de ligação entre o plano espiritual e a terra.
Onde está a lógica e o bom senso?
Temos notícia de um Centro que tem um estatuto que elegeu o seu presidente vitaliciamente, enquanto encarnado, e "mentor" do Centro após o seu desencarne. Tudo isso por inspiração do Dr. Bezerra de Menezes.
Pasmem, senhores! Envolveram no esquema, até o nome desse respeitável espírito.
Depois de realizar palestra numa Casa Espírita, falando sobre "O que não é Espiritismo", fomos convidados após a exposição, para assistir à parte prática da noite. Havia vários médiuns na mesa.
Algumas comunicações repetitivas. Ao final, o Presidente do Centro, que também era dirigente do trabalho e "médium de cabeceira da mesa", recebendo o "mentor", disse que a reunião tinha sido muito bonita, mas que ele não concordava com muita coisa que a doutrina ensinava, acrescentando que ali somente as suas orientações eram válidas. Segundo o citado "mentor", Kardec tem muita coisa a aprender.
Outra coisa aconteceu num Centro Espírita da capital. Sala super-lotada. Pessoas com senhas numeradas na mão para receber o passe. A mesa repleta de papeletas e fotografias de todos os tamanhos. Preparação do ambiente. Prece recitada. Em seguida, a entrada de uma médium com postura robotizada, vestida toda de branco, roupa estilo camisolão, cantando hinos sacros usados nas cerimônias ritualísticas de conhecida religião. Mas a coisa não parou por aí. À medida em que a palestra se desenrolava, a referida senhora saía de trás de uma cortina que separava a sala de passe do salão, e em voz alta chamava pelo número o candidato ao passe, que não retornava ao salão de reunião pública após ter sido atendido, esvaziando-se, paulatinamente, o local.
Tudo muito estranho e preocupante para mim. Diante disso tudo, vejamos o que tem a nos dizer o Prof. José Herculano Pires, no livro de sua autoria, denominado "O Centro Espírita":
"Os dirigentes de Centros precisam tomar conhecimento desses absurdos e lutar contra eles, porque essas invencionices ridículas atrasam o desenvolvimento da Doutrina e afastam dos Centros as pessoas que sabem pensar. Que os dirigentes, por mais modestos que sejam, não se esqueçam da bússola que lhes permitirá navegar com segurança nas águas tumultuosas: a Codificação de Allan Kardec. Kardec é a base e a cúpula da Doutrina, com apoio que nunca lhe faltou do Espírito da Verdade. Se não queremos novidades é porque os novidadeiros somente se apóiam em suas pretensões individuais".
Os dirigentes espíritas precisam tomar conhecimento de que não se pode misturar uma doutrina científica e filosófica como é o Espiritismo com práticas que não se coadunam com ela. Não se trata de um repúdio, mas de uma questão de método e cultura.
O Centro Espírita bem dirigido por pessoas sensatas e estudiosas é uma concha acústica em que ressoam as vozes e os pensamentos dos Espíritos e dos homens, no diálogo dos mundos, pois nele se encontram o mundo espiritual e o mundo terreno, nas possibilidades abertas pelos dons mediúnicos de que todos dispomos.
Os que deturpam a finalidade superior do Centro Espírita, sejam dirigentes ou freqüentadores, só interessados em vantagens imediatas, perdem a oportunidade de se elevarem a uma visão superior do mundo, do homem e da vida. Se cada freqüentador do Centro Espírita quiser ajudá-lo na sua missão superior de preparar os homens para um mundo melhor, a dinâmica do Centro intensificar-se-á para o bem de todos.

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