quinta-feira, 31 de julho de 2014

Não Deixe Ninguém Apagar a sua Luz Alamar Régis Carvalho


            Muitas moças, jovens, fecham-se para a vida, abandonam os seus talentos, deixam o trabalho, param de estudar e se privam de tudo, por causa de exigências de namorados.


            Mulheres, diversas e inúmeras, contadas aos milhões, também fecham-se totalmente e despem-se da própria personalidade, por causa de exigências de maridos insensíveis, que só conseguem assimilar o ser humano do sexo feminino como objeto masculino, empregada doméstica que deve tratar da sua alimentação, da lavagem de roupas, do comando do fogão e da faxina doméstica, restringindo a sua vida às quatro paredes do lar... ou melhor, da casa onde moram, longe de ser um Lar.



            Homens bons se vêem obrigados a romperem com velhas e sinceras amizades, principalmente quando do sexo feminino, para se submeterem ao desequilíbrio emocional de namoradas e esposas, perturbadas pela lamentável doença do ciúme, fazendo-o objeto seu, uma coisa sua, um robô comandado pelo seu controle remoto.



            Muitas mães vivem angustiadas, sem direito ao laser, a qualquer conforto e até ao direito de abrirem a boca para falar alguma coisa, para satisfazerem aos incontroláveis desejos de filhos insensíveis, frios e indiferentes em relação a elas, que as tratam de forma grosseira, estúpida e mal educada, concebendo-as nas limitações de uma empregada doméstica que tem que preparar a sua comida na hora certa, lavar e passar as suas roupas, catar os seus tênis e roupas sujas espalhadas pelos cantos da casa e suportar os seus chiliques.



            Muitos pais sofrem também pela indiferença de esposas e filhos que os vêem apenas como o cofre da família, sem lembrarem no dia-a-dia que ele existe, sem um gesto de carinho, afeto e muito menos qualquer relação de amizade, a não ser nos momentos em que estão precisando de dinheiro para alguma coisa.



            Muitas mulheres se conformam em ter a saúde sua e dos seus filhos afetadas pelas nicotinas incontroláveis de maridos que fumam sem o menor escrúpulo, indiferentes às conseqüências danosas do tabagismo fumado indiretamente por pessoas inocentes que nada tem a ver com um vício tão danoso.



            Pessoas outras, que se deixam levar por lavagens cerebrais promovidas por rotulações de líderes religiosos, anulam-se para a vida, proíbem-se do laser, da alegria e do divertimento em geral, sem o direito ao menos de darem um sorriso e se vestirem como gostam, para atenderem conveniências igrejeiras.



            Por que essas coisas acontecem? Por que há tanta gente manipulando tanta gente?



            Por que ainda há quem se permite ser fantoche dos outros e marionete das conveniências e dos desequilíbrios de perturbados?



            Creio que você, que está lendo este manifesto, não sofra de situações como estas, mas deve conhecer alguém, talvez muito próximo de você, que esteja inserido e um destes casos.



            Na luta da exploração humana pelos próprios humanos, devemos estar atentos e procurarmos dar um “basta!!!”, imediatamente, para situações como estas.     
  
            Ninguém tem o direito de manipular ninguém!!!



            Ninguém torna-se humilde, bom e quite com Jesus ou com qualquer ser espiritual por ser masoquista, se deixando explorar e muito menos dominar por mentes doentias e dominadoras.



            Qualquer orientação que alguém queira lhe dar, pedindo paciência, tolerância e conformação com pessoas ciumentas, violentas, agressivas, possessivas, frias, insensíveis e desumanas que lhe fazem mal, mesmo sendo da própria família, que lhe agridem sem parar e que lhe anulam pela vida, não pode ser considerada como orientação sensata e sim como uma forma para manter-lhe sobrevivendo em um esgoto. Tudo tem limites!



            Todas as tentativas para ajudar uma pessoa a libertar-se de vícios, de manias, de ciúmes, chantagens e instintos violentos ou imorais são válidas e devem ser feitas, sempre, o máximo que lhe for possível, recorrendo a todas as opções que estiverem ao seu alcance. Mas quando você percebe que a pessoa perturbada não faz o menor esforço em se libertar das suas más tendências, não quer se modificar e, muito pelo contrário, ainda debocha da sua cara, mantendo-lhe sob o seu domínio e conforme as suas conveniências, não tenha a menor dúvida de que o melhor remédio é o que se pode chamar de “pé na bunda”, com um sonoro e enérgico BASTA!!!



            Se a sua capacidade física é de suportar apenas cinqüenta quilos, por exemplo, não tente cometer a loucura de querer suportar, sobre você, pesos de duzentos quilos, apenas para dar satisfação à sociedade e muito menos a parentes, que você se esmaga.



            Muitos se suicidam ou são vitimadas por infartos ou outros acidentes corporais que lhes levam à morte, por não suportarem as pressões, as chantagens e a exploração de outras pessoas, temerosas de darem o grito de liberdade, com receio da língua dos outros.



            Não sejamos escravos de ninguém. Não deixemos que a demagogia direcione a nossa vida, nunca.



            Mulheres que já são casadas ou vivem, mesmo fora do casamento, há muito tempo com verdadeiros animais ciumentos incontroláveis e que só lhe causam desgostos, aborrecimentos e infelicidades nas suas vidas, estão em tempo, sim, de dar o seu grito de liberdade, apesar de imaginarem, equivocadamente, o tal “ruim com ele, pior sem ele”. Conversa fiada, não existe nada pior do que uma vida de interminável humilhação, chantagem, frieza e indiferença.



            O mesmo se aplica a homens casados com jararacas venenosas, que fazem das suas vidas o que querem. Libertem-se!!! Mulheres possessivas é uma praga, é um inferno na vida de qualquer homem.



            Jovens, adolescentes, pelo amor de Deus não cometam a burrice de iniciarem namoros com pessoas ciumentas! O ciúme é a pior praga que existe em um ser humano que pretende associar-se com outro. É certeza de brigas, desentendimentos e infelicidade constante. Não vá na conversa de alguns que dizem a certos casais de namorados que quando casarem a coisa melhora, que não é verdade. Muito pelo contrário, a tendência é somente piorar, já que ciúme nunca foi tempero do amor e sim a pimenta malagueta da relação humana, que gera a desconfiança, a cobrança, o desconforto, o mal estar, o patrulhamento, a insegurança, as brigas constantes, a inconveniência, a agressão aos próprios amigos, a exposição ao ridículo, os ferimentos morais e físicos e até  tragédias extremamente dolorosas.



            Por mais que os olhos sejam belos, conforme a sua exigência, os cabelos bonitos, pernas grossas, seios atraentes, bunda grande e todos os atrativos materiais conforme os sonhos daqueles que só conseguem avaliar a qualidade das pessoas pelos seus dotes físicos, caia fora, ao constatar o instinto ciumento, em benefício da sua própria felicidade. 



            Em vez de medir as criaturas dos pés à cabeça, como fazem as pessoas comuns, procure medi-las da cabeça para cima, como fazem as pessoas elevadas, porque só assim terá condições de avaliar os verdadeiros valores e afinidades que garantem uma relação mais estável, amável, agradável, saudável e durável. 



            Não deixe que ninguém apague a sua luz!!!



            Se você sonha em fazer uma faculdade, vá fazer a sua faculdade, porque os desejos que têm que prevalecer são os seus. Não permita a interferência de ninguém.



            Se você quer seguir a música, o direito, a medicina, o comércio, a agricultura... ou seja lá o que for, consulte com cuidado, paciência, sensatez, critério e responsabilidade o seu próprio coração,  faça o que ele determinar e não tema a língua dos outros.



            Lembre-se de um detalhe muito importante: Quando Jesus recomendou o “Ame ao vosso próximo”, ele deixou bem claro o “como a si mesmo”. Quem não é capaz de amar a si mesmo, obviamente não tem condições de amar ninguém, porque ninguém dá o que não tem.



            Nada de acharmos que amando a nós mesmos estamos sendo egoístas, porque não estamos. O que não é recomendável e constitui-se, de fato, em egoísmo é amarmos apenas e somente a nós mesmos, o que é totalmente diferente.



            Não sejamos escravos do falso moralismo, do moralismo de moda, de região, de época e de conveniências, porque isto só causa sofrimento. Consultemos a nossa consciência, onde está escrita a verdadeira Lei de Deus, e vivamos conforme uma moral autêntica. 



            Masoquismo não cai bem em pessoas sensatas e racionais.



            Vamos à luta e



            Não deixemos que ninguém apague a nossa luz.



Artigo recebido do autor com autorização de reprodução

quarta-feira, 30 de julho de 2014

Faz Jesus Sofrer a seus Amigos? Renato Costa



Uma das vidas relatadas pelo Espírito que ditou a Eudaldo Pagés e Amália Domingo Soler a obra Perdôo-te é facilmente identificado como sendo a de Teresa D’Avilla, a notável mística espanhola do século XVI. Naquela magnífica autobiografia, Teresa (Espírito) conta em detalhes como soube, comcerteza, que seus escritos seriam adulterados após a sua morte de modo a ficarem conformes a uma visão tolerada pela alta hierarquia da Igreja deentão.

A despeito da advertência da própria Teresa, Espírito, no entanto, existe um relato de uma passagem na vida daquela grande médium da Igreja, contado na obra Os Santos que Abalaram o Mundo, de René Fülöp-Miller, que nos parece muito propícia a um estudo. Se verdadeira na autenticidade do relato histórico ou vítima de uma adulteração cuidadosa e sábia feita posteriormente, o fato é que o dito relato algo importante nos tem a ensinar.

Conta Fülöp-Milller que, já estando no final da vida, com o corpo cansado pelas muitas provações que sofrera, a destemida amiga de Jesus havia partidocom uma caravana para fundar um novo convento em Burgos. As estradas estavam inundadas pelas chuvas e era necessário atravessar o Rio Arlazónantes de se chegar ao destino. Tendo sido destruída a ponte pela força das águas, segundo relata o autor, Teresa atirou-se bravamente à travessia, conclamando suas companheiras com alegria e determinação: “Venha o que vier. Se desmaiardes no caminho, se morrerdes na estrada, se o mundofor destruído, tudo isto está bem se atingirdes o vosso alvo.” Desse modo, conclamando todas a segui-la, avançou corajosamente pela água gelada. Foi, então, que uma onda a fez escorregar para a parte mais funda do rio. Sem se mostrar aterrorizada, Teresa dirigiu-se, como costumeiro, ao amadoMestre pedindo ajuda. Vamos, pois, ao diálogo.

- Oh Senhor, por que puseste tais dificuldades em nosso caminho?

Aparecendo sobre as águas na visão espiritual da médium Teresa, Jesus respondeu:

- É assim que trato meus amigos.

Ao que Teresa, que segundo Fülöp-Miller, jamais perdia a oportunidade de uma resposta, retrucou:

- Ah! Meu Senhor, é por isso que tendes tão poucos.

Ora, será verdade que Jesus permite aos seus amigos os maiores sofrimentos? Sem maiores análises, a primeira vista, as palavras de Jesus escutadas por Teresa parecem sugerir um Jesus sádico que aprecia ver seus amigos sofrerem para testar sua amizade. Como, no entanto,sentimentos negativos inexistem no psiquismo de um Espírito do adiantamento de Jesus, deve haver outra explicação. Consultando a Codificação, vamos encontrar parte da explicação que desejamos no Item 9, Capítulo V de O Evangelho Segundo o Espiritismo, sob o título de “Bem-aventuradosos Aflitos”:

“Não há crer, no entanto, que todo sofrimento suportado neste mundo denote a existência de uma determinada falta. Muitas vezes são simplesprovas buscadas pelo Espírito para concluir a sua depuração e ativar o seu progresso.

Assim, a expiação serve sempre de prova, mas nem sempre a prova é uma expiação. Provas e expiações, todavia, são sempre sinais derelativa inferioridade, porquanto o que é perfeito não precisa ser provado. Pode,

pois, um Espírito haver chegado a certo grau de elevação e, nada obstante, desejoso de adiantar-se mais, solicitar uma missão, uma tarefa aexecutar, pela qual tanto mais recompensado será, se sair vitorioso, quanto mais rude haja sido a luta. Tais são, especialmente, essas pessoasde instintos naturalmente bons, de alma elevada, de nobres sentimentos inatos, que parece nada de mau haverem trazido de suas precedentesexistências e que sofrem, com resignação toda cristã, as maiores dores, somente pedindo a Deus que as possam suportar sem murmurar.Pode-se, ao contrário, considerar como expiações as aflições que provocam queixas e impelem o homem à revolta contra Deus.

Sem dúvida, o sofrimento que não provoca queixumes pode ser uma expiação; mas, é indício de que foi buscada voluntariamente, antes queimposta, e constitui prova de forte resolução, o que é sinal de progresso.”

Com o esclarecimento que obtivemos do ESE, as coisas começam a clarear. O sofrimento por que passou Teresa ao longo de toda a sua vida tinhaum propósito educativo e não lhe havia sido imposto mas aceito por ela na espiritualidade com o intuito de enrijecer sua força de vontade direcionadapara o bem.

Resta-nos, ainda, analisar a segunda parte do relato, isto é, a afirmação de Jesus de que era assim que tratava os seus amigos. E, mais, a terceiraparte, o comentário final de Teresa, ao dizer que por isso os teria Jesus em tão pequena quantidade.

O que é ser amigo de Jesus? Observemos bem que não estamos falando de ser Jesus nosso amigo e sim de ser um de nós amigo de Jesus.

Após algumas pesquisas na Web, procurando por “amigo de Jesus” encontramos inúmeras páginas, de diversas religiões e crenças, discorrendo sobreJesus amigo, nosso amigo Jesus, Jesus te ama, Jesus meu amigo, ... Nenhuma página, no entanto, falava de “amigo de Jesus”.

Ora, o fato de que Jesus é nosso amigo, seus ensinamentos, seu exemplo de vida, a dedicação e o amor que o Mestre tem-nos dedicado há milhões deanos são testemunho mais do que eloqüente. E nós, somos amigos de Jesus?

Em uma passagem do Evangelho de Mateus a que as Bíblias católicas dão o título de “O Juízo Final” mas que, sob a ótica espírita se aplicaperfeitamente à definição que estudamos, podemos ler como Jesus define os seus amigos:

"Vinde benditos de meu Pai, tomai posse do Reino que vos está preparado desde a criação do mundo, porque tive fome e me destes de comer; tive sede e me destes de beber; era peregrino e me acolhestes; nu e me vestistes; enfermo e me visitastes; estava na prisão e viestes a mim. Perguntar-lhe-ão os justos: Senhor, quando foi que te vimos com fome e te demos de comer, com sede e te demos de beber? Quando foi que tevimos peregrino e te acolhemos, nu e te vestimos? Quando foi que te vimos enfermo ou na prisão e te fomos visitar? Em verdade vos declaro: todas as vezes fizestes isso a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim mesmo que o fizestes" (Mateus, 25 de 35 a 40).

Ora, se Jesus chamou àqueles que ajudam os necessitados de toda espécie onde quer que se encontrem de “benditos de meu Pai”, que “tomarão oReino” que para eles está preparado, se Jesus nos ensinou que o segundo mandamento é “Amar ao próximo como a si mesmo” que, junto com oprimeiro, “Amar a Deus sobre todas as coisas” resume toda a Lei e os Profetas, fica claro, a nosso ver, que quem segue tais diretrizes merece serchamado de “amigo de Jesus”.

Como concluiremos, se analisarmos o comportamento nosso e o das pessoas à nossa volta, assim como o da humanidade ao largo, são poucos,muito poucos, os que podem ser chamados de amigos de Jesus pois, para que um de nós assim possa ser chamado, é necessário noscomprometermos na espiritualidade a vencer todos os obstáculos que surjam à nossa frente na prática no bem e, o que é muito mais difícil, sermos fiéis ao compromisso assumido. Então, como poderemos adquirir fibra para enfrentar todos os obstáculos por maiores que sejam, de modo a nostornarmos amigos de Jesus como o próprio Jesus os define? Aceitando vir em várias, muitas, vidas de provação de modo a provarmos a Jesus e,sobretudo, a nós mesmos que jamais esmoreceremos em nosso nobre objetivo.

Entendemos, assim, a fala de Jesus para Teresa, assim como a sua sábia resposta.




Bibliografia 



FÜLÖP-MILLER, René. Os Santos que Abalaram o Mundo. 14.ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1999.

KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 112.ed. Rio de Janeiro: FEB, 1996.

PAGÉS, Eudaldo e SOLER, Amália Domingo. Perdôo-te. 7.ed. Brasília: LGE, 2002.

Bíblia Sagrada. Versão dos Monges de Mardesous. São Paulo: Ave-maria, 1997.




(Artigo originalmente publicado em Reformador, edição de dezembro de 2004)

terça-feira, 29 de julho de 2014

Falar ou não falar? Orson Peter Carrara e Américo Sucena


    Eis uma questão muito delicada. Como agir diante de circunstâncias, fatos, posturas que denotem conduta inadequada? Quando devemos e como fazermos para chamar a atenção de alguém  por comportamentos que comprometem a segurança e paz de outras criaturas, por exemplo? Ou, de alguém que se rebela diante dos critérios de funcionamento de uma reunião ou instituição?

    Há que se considerar que cada caso é um caso por si só. Há agravantes, atenuantes, características próprias e peculiaridades a cada situação que nunca permitem estabelecer-se uma receita pronta que resolva todas as ocorrências. Por isso recorramos à Doutrina Espírita.

    O capítulo X de O Evangelho Segundo o Espiritismo traz importante contribuição ao estudo do tema. Kardec o intitulou Bem Aventurados Aqueles que são Misericordiosos, inserindo instruções dos espíritos    sobre o perdão, a indulgência, reconciliação com os adversários e suas próprias análises, inclusive também sobre o ensino de Jesus do Não Julgueis. 

    Para análise e reflexão geral, porém, transcrevemos abaixo as instruções do Espírito São Luiz pertinentes à delicada questão e constantes do final do referido capítulo (os grifos são nossos):


“(...) É permitido repreender os outros, notar as imperfeições de outrem, divulgar o mal de outrem?  

19. Ninguém sendo perfeito, seguir-se-á que ninguém tem o direito de repreender o seu próximo? Certamente que não é essa a conclusão a tirar-se, porquanto cada um de vós deve trabalhar pelo progresso de todos e, sobretudo, daqueles cuja tutela vos foi confiada. Mas, por isso mesmo,deveis fazê-lo com moderação, para um fim útil, e não, como as mais das vezes, pelo prazer de denegrir. Neste último caso, a repreensão é uma maldade; no primeiro, é um dever que a caridade manda seja cumprido com todo o cuidado possível. Ao demais, a censura que alguém faça a outrem deve ao mesmo tempo dirigi-la a si próprio, procurando saber se não a terá merecido. — S. Luís. (Paris, 1860.)

20. Será repreensível notarem-se as imperfeições dos outros, quando daí nenhum proveito possa resultar para eles, uma vez que não sejam divulgadas? Tudo depende da intenção. Decerto, a ninguém é defeso ver o mal, quando ele existe. Fora mesmo inconveniente ver em toda a parte só o bem. Semelhante ilusão prejudicaria o progresso. O erro está no fazer-se que a observação redunde em detrimento do próximo, desacreditando-o, sem necessidade, na opinião geral.  Igualmente repreensível seria fazê-lo alguém apenas para dar expansão a um sentimento de malevolência e à satisfação de apanhar os outros em falta. Dá-se inteiramente o contrário quando, estendendo sobre o mal um véu, para que o público não o veja, aquele que note os defeitos do próximo o faça em seu proveito pessoal, isto é, para se exercitar em evitar o que reprova nos outros. Essa observação, em suma, não é proveitosa ao moralista? Como pintaria ele os defeitos humanos, se não estudasse os modelos? — S. Luís. (Paris, 1860.)

21. Haverá casos em que convenha se desvende o mal de outrem? É muito delicada esta questão e, para resolvê-la, necessário se torna apelar para a caridade bem compreendida.
Se as imperfeições de uma pessoa só a ela prejudicam, nenhuma utilidade haverá nunca em divulgá-la. Se, porém, podem acarretar prejuízo a terceiros, deve-se atender de preferência ao interesse do maior número. Segundo as circunstâncias, desmascarar a hipocrisia e a mentira pode constituir um dever, pois mais vale caia um homem, do que virem muitos a ser suas vítimas. Em tal caso, deve-se pesar a soma das vantagens e dos inconvenientes. — São Luís. (Paris, 1860.)”. 


    Eis o grande desafio: perceber realmente essa observação final da instrução superior. Daí a própria instrução acima transcrita destacar: É muito delicada esta questão e, para resolvê-la, necessário se torna apelar para a caridade bem compreendida.    A caridade bem compreendida engloba, conforme a entendia Jesus o perdão das ofensas, a benevolência para com todos e a indulgência para com as faltas alheias, conforme ensino da questão 886 de O Livro dos Espíritos, onde Kardec acrescenta como comentário pessoal: “(...) amar ao próximo é fazer-lhe todo o bem que está ao nosso alcance e que gostaríamos nos fosse feito a nós mesmos. (...)”. 

    Por outro lado, o tema também é abordado na questão 903 de O Livro dos Espíritos:  


“903. Incorre em culpa o homem, por estudar os defeitos alheios? Incorrerá em grande culpa, se o fizer para os criticar e divulgar, porque será faltar com a caridade. Se o fizer, para tirar daí proveito, para evitá-los, tal estudo poderá ser-lhe de alguma utilidade. Importa, porém, não esquecer que a indulgência para com os defeitos de outrem é uma das virtudes contidas na caridade. Antes de censurardes as imperfeições dos outros, vede se de vós não poderão dizer o mesmo. Tratai, pois, de possuir as qualidades opostas aos defeitos que criticais no vosso semelhante. Esse o meio de vos tornardes superiores a ele. Se lhe censurais o ser avaro, sede generosos; se o ser orgulhoso, sede humildes e modestos; se o ser áspero, sede brandos; se o proceder com pequenez, sede grandes em todas as vossas ações. Numa palavra, fazei por maneira que se não vos possam aplicar estas palavras de Jesus: Vê o argueiro no olho do seu vizinho e não vê a trave no seu próprio.”


    Portanto, haverá casos e casos, mas sempre a caridade deverá pautar nossas ações, ainda que para advertir, afastar ou orientar alguém. Muitas vezes nos depararemos com pessoas e situações que trarão prejuízos a muitos e o dever da caridade impõe nossa ação de Falar ao invés de Não falar.  Porém, sem interferir no livre arbítrio das criaturas. E, ao mesmo tempo, usando da indulgência, como ensinam os Bons Espíritos. Eis o desafio a nos ensinar...

Nota: A presente matéria é resultado de pesquisa e indicação de Américo Sucena e elaboração textual de Orson Peter Carrara.


Artigo recebido do autor (Orson) com autorização de reprodução

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Esqueça esta Idéia Orson Peter Carrara


      Meu caro leitor, se você é daquelas pessoas que está enfrentando difícil fase de sua existência, com escassez de recursos financeiros, enfermidades ou complexos desafios pessoais (na vida familiar ou não) e está se sentindo muito abatido, gostaria de convidá-lo a uma grave reflexão.

      Todos temos visto a ocorrência triste e dramática daqueles que se lançam ao suicídio, das mais variadas formas. A idéia infeliz surge, é alimentada pelo agravamento dos problemas do cotidiano e concretiza-se no ato infeliz do auto-extermínio.

      Diante de possíveis angústias e estados depressivos, não há outro remédio senão a calma, a paciência e a confiança na vida, que sempre nos reserva o melhor ou o que temos necessidade de enfrentar para aprender. Ações precipitadas, suicídios e atos insanos são praticados devido ao desespero que atinge muitas pessoas que não conseguem enxergar os benefícios que as cercam de todos os lados.

      Mas é interessante ressaltar que estes estados de alma, de desalento, de angústias, de atribulações de toda ordem, não são casos isolados. Eles integram a vida humana. Milhões de pessoas, em todo mundo, lutam com esses enigmas como alunos que quebram a cabeça tentando resolver exercícios de física ou matemática. Mas até uma criança sabe que o problema que parece insolúvel não se resolverá rasgando o caderno e fugindo da sala de aula.

      Sim, a comparação é notável. Destruir o próprio corpo, a própria vida, como aparente solução é uma decisão absurda. Vejamos os problemas como autênticos desafios de aprendizado, nunca como castigos ou questões insuperáveis. Tudo tem uma solução, ainda que difícil ou demorada.

      Deixaremos de abordar a questão religiosa da questão em respeito ao perfil desta coluna e aos pacientes leitores de toda semana, mas desejamos apenas afirmar que o suicídio, ao invés de resolver problemas, precipita seu próprio autor em abismos agravados de dificuldades e tormento, onde o remorso e a angústia superlativos são milhares de vezes piores que o motivo que o levou ao ato extremo. Aos que desejarem, poderemos indicar literatura específica sobre o tema.

      O fato, porém, é que precisamos sempre resistir aos embates do cotidiano com muita coragem e determinação. Viver é algo extraordinário. Tudo, mas tudo mesmo, passa. Para que entregar-se ao desespero? Há razões de sobra para sorrir, rir e viver...!

      Meu amigo, minha amiga, pense no tesouro que é tua vida, de tua família! Jamais te deixes enganar pela ilusão do suicídio. Viva! Viva intensamente! Com alegria! Que não te perturbe nem a dificuldade, nem a enfermidade, nem a carência material. Confie, meu caro, e prossiga! 



(Artigo reproduzido do site do autor com a sua autorização)

sábado, 26 de julho de 2014

Conhecimento de Si Mesmo Sérgio Biagi Gregório

SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Conceito. 3. Filosofia e História da Filosofia. 4. O Problema do Conhecimento: 4.1. Pensamento e Verdade; 4.2. Estoque de Conhecimento; 4.3. Aquisição, Retenção e Utilização do Conhecimento. 5. Da Maiêutica Socrática aos Automatismos da Vida Presente: 5.1. Maiêutica; 5.2. Reflexão; 5.3. Herança e Automatismo. 6. Como Conhecer-se: 6.1. Pela Dor; 6.2. Convívio com o Próximo; 6.3. Auto-Análise. 7. Conclusão. 8. Bibliografia Consultada.
1. INTRODUÇÃO
O objetivo deste estudo é dar ênfase à tomada de consciência de nossas potencialidades e de nossos limites, no sentido de fazermos uma avaliação mais serena e mais tranqüila de nós mesmos. Os tópicos a serem abordados são: conceito de conhecimento, Sócrates e o Conhece-te a ti mesmo, Senso Crítico e Como Conhecer-se.
2. CONCEITO
Conhecimento. 1. Ato ou efeito de conhecer. 2. idéia, noção. 3. Informação, notícia, ciência. 4. Filos. No sentido mais amplo, atributo geral que têm os seres vivos de reagir ativamente ao mundo circundante, na medida da sua organização biológica e no sentido da sua sobrevivência 5. Filos. Apropriação do objeto pelo pensamento, como quer que se conceba essa apropriação: como definição, como percepção clara, apreensão completa, análise etc. (Dicionário Aurélio)
Conhecimento de si mesmo. [Nosce te ipsum]. Conceito que se encontra inscrito no pórtico do Santuário de Delfos, em grego: "Gnôthi seauton" e que significa: "Conhece-te a ti próprio", estrutura moral da filosofia de Sócrates, na sua escola maiêutica. (Equipe da FEB, 1995).
3. FILOSOFIA E HISTÓRIA DA FILOSOFIA
Enquanto a Ciência tenta explicar como se dão os fatos, construindo a partir de um objeto e do saber que num momento se possui acerca dele, medindo-os, comparando-os e classificando-os, a Filosofia, que trata dela mesma, quer saber porque se deram desta forma e não de outra. Assim, para que possamos penetrar no "conhece-te a ti mesmo" de Sócrates, temos de colocá-lo dentro de um contexto geral, pois a Filosofia parte de coisas já conhecidas, e segue pelas descobertas de outros filósofos como que acrescentando algo ao já existente.
Os pensadores que precederam Sócrates queriam descobrir o princípio das coisas. Este princípio é expresso, para cada um deles, nos seguintes termos: para Tales de Mileto, o princípio de tudo era a água; para Anaximandro, o infinito, o ilimitado; para Anaxímenes, o ar, o fogo, as nuvens e a rocha; para Pitágoras, o número; para Parmênides, o ente, o ser; para Heráclito, o ser dinâmico; para Empédocles, o ar, o fogo, a terra e a água; para Anaxágoras, tudo em todas as coisas; para Demócrito, o átomo – última divisão do ser.
Sócrates, por seu turno, faz o indivíduo voltar-se para si mesmo, a fim de conhecer-se melhor.
4. O PROBLEMA DO CONHECIMENTO
4.1. PENSAMENTO E VERDADE
Conhecer é reproduzir em nosso pensamento a realidade. Damos o nome de conhecimento à posse deste pensamento que concorda com a realidade. À concordância do pensamento com a realidade chamamos verdade.
Que é pensar bem? André Maurois, em A Arte de Viver, diz-nos que é chegar a fazer, de nosso pequeno modelo interior de mundo, uma imagem tão exata quanto somos capazes, do grande mundo real.
Que é verdade? Pauli, em Que é pensar, entende por verdade, no mais amplo sentido, a autenticidade que o conhecimento deve oferecer. Os dados são verdadeiros se são o que anunciam. Se os dados, na hipótese do psicologismo, se comportam como dados puros, a autenticidade se encontra nesta pureza. Se os dados, na hipótese do intencionalismo, anunciam objetos, a autenticidade se encontra em efetivamente noticiá-los, não dizendo que noticiam (quando de fato não noticiam e enganam), nem dizendo que noticiam tal espécie de objetos (quando de fato noticiam outra espécie). (1964, p. 88 e 89)
4.2. ESTOQUE DE CONHECIMENTO
O conhecimento acumulado pela humanidade está registrado nos arquivos das bibliotecas espalhadas pelo mundo inteiro. Ele compõe-se de livros, revistas, jornais, periódicos etc. A invenção da imprensa por Johann Guttenberg (1398-1468) é responsável por esse fato, pois a nova técnica de produção literária propiciou a veiculação de uma grande quantidade de conhecimentos que até então estava adormecida. É que os trabalhos dos grandes pensadores, podendo ser duplicados com mais facilidade, aumentou sobremaneira o número de obras à disposição da população.
4.3. AQUISIÇÃO, RETENÇÃO E UTILIZAÇÃO DO CONHECIMENTO
O conhecimento pode ser adquirido de forma empírica, vulgar, intelectual, científica e intuitiva. Porém, a freqüência em cursos, a pesquisa em livros e os diversos tipos de conversações fazem-nos penetrar objetivamente no estoque de conhecimento acumulado pela humanidade. Além do mais, a associação de idéias que dessas pesquisas advém, aumenta ainda mais esse estoque.
retenção do conhecimento envolve não só o interesse acerca de um assunto como também a apreensão de técnicas de memorização das informações. Lembremo-nos de que nem sempre uma boa memória é sinal de grande inteligência. É o caso do médico, de excelente memória, que tinha dificuldade em prescrever uma receita médica.
utilização do conhecimento deve ser sempre para o bem, procurando-se não colocar a candeia debaixo do alqueire. (Lessa, 1960, p. 240 a 246)
5. DA MAIÊUTICA SOCRÁTICA AOS AUTOMATISMOS DA VIDA PRESENTE.
5.1. MAIÊUTICA
Como vimos anteriormente, os ensinamentos e reflexões dos primeiros filósofos se voltaram para os problemas do ser, do movimento e da substância primordial do mundo, a "physis", procurando dar-lhes uma explicação racional. Entre tais mestres, situamos Heráclito, Pitágoras e Demócrito. Sócrates, dizia ser boa, mas queria apresentar algo mais substancioso, ou seja: o homem deveria voltar para si mesmo.
Conhece-te a ti próprio é o dístico colocado no frontispício do oráculo de Delfos. Após a visita de Sócrates a este templo, emanam-se dois diálogos, que podem ser encontrados em: Platão (Alcibíades, 128d-129) e Xenofontes (Memoráveis, IV, II, 26).
Sócrates procura o conceito. Este é alcançado através de perguntas. As perguntas têm um duplo caráter: ironia e maiêutica. Na ironia, confunde o conhecimento sensível e dogmático. Na maiêutica, dá à luz um novo conhecimento, um aprofundamento, sem, contudo, chegar ao conhecimento absoluto.
5.2. REFLEXÃO
É uma volta sobre si mesmo. A reflexão seria mais perfeita se fosse somente sobre o próprio pensamento, sem a intervenção dos sentidos; mas, como o pensamento e os sentidos são inseparáveis, de qualquer forma é uma reflexão.
A reflexão faz-nos comparar e raciocinar, a fim de chegarmos a um acordo com a nossa própria consciência. (Pauli, 1964, p. 88)
5.3. HERANÇA E AUTOMATISMO
O princípio inteligente estagiando no reino mineral adquiriu a atração; no reino vegetal, a sensação; no reino animal, o instinto; no reino hominal, o livre-arbítrio, o pensamento contínuo e a razão. Hoje, somos o resultado de toda essa herança cultural.
Nosso passado histórico propiciou-nos a automatização de hábitos e atitudes. É nossa herança, que começa desde o reino mineral. Há hábitos positivos e negativos. Os positivos devem ser incrementados; os negativos, extirpados. A função da reforma íntima, no seu sentido amplo, é melhorar o reflexo condicionado, arquitetado pelo nosso Espírito.
A lei do progresso exige que o princípio inteligente vá-se despojando dos liames da matéria. Para que tenhamos um olhar crítico, devemos libertar-nos da obscuridade da matéria, consubstanciada no egoísmo, no orgulho e no interesse próprio. (Xavier, 1977, p. 39)
5. COMO CONHECER-SE
De acordo com Peres, no capítulo I do seu Manual Prático do Espírita, podemos nos conhecer:
6.1. PELA DOR
a dor é teleológica e leva consigo um destino. Por ela podemos saber o que fomos e, também, o que tencionamos ser. Ela é sempre positiva; no sofrimento, estamos purgando algo ou preparando-nos para o futuro.
6.2. CONVÍVIO COM O PRÓXIMO
Podemos avaliar-nos, observando as reações dos outros com relação às nossas atitudes.
6.3. AUTO-ANÁLISE
A auto-análise fundamenta-se numa cosmovisão transcendental da vida. A compreensão integral do homem se apoia em três esteios fundamentais: filosófico: paz com a verdade; o psicológico: paz consigo mesmo; religioso: paz com o ser transcendental.
São técnicas que permitem o homem chegar a autenticidade de sua doença, não de tirar o homem da doença.
As questões 919 e 919A de O Livro dos Espíritos auxiliam-nos a praticá-la. Santo Agostinho sugere que todas as noites devíamos revisar o dia para ver como fomos em pensamentos, palavras e atos.
7. CONCLUSÃO
Embora haja dificuldade de conhecermos a nós mesmos, uma avaliação serena de nossa dor e do nosso relacionamento com o próximo pode oferecer-nos uma luz no fim do túnel. Além do mais, tomando consciência de nossa ignorância, estaremos alicerçados para detectar a nossa verdadeira capacidade.
8. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
EQUIPE DA FEB. O Espiritismo de A a Z. Rio de Janeiro: FEB, 1995.
FERREIRA, A. B. de H. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, [s. d. p.]
KARDEC, A. O Livro dos Espíritos. São Paulo, FEESP, 1972.
LESSA, G. Em Busca de Claridade. Rio de Janeiro, Fundo de Cultura, 1960.
PAULI, E. Que é Pensar (Teoria Fundamental do Conhecimento). Florianópolis, Ed. Biblioteca Superior de Cultura, 1964.
PERES, N. P. Manual Prático do Espírita. São Paulo, Pensamento, 1984.
SAUVAGE, M. Sócrates e a Consciência do Homem. São Paulo, Agir, 1959.
XAVIER, F. C. e VIEIRA, W. Evolução em Dois Mundos, pelo Espírito André Luiz, 4. ed., Rio de Janeiro, FEB, 1977.

Diálogo sobre o Conhece-te a Ti Mesmo
I
Sócrates — agora, qual será a arte pela qual poderíamos nos preocupar conosco?
Alcibíades — Isto eu ignoro.
Sócrates — Em todo o caso, estamos de acordo num ponto: não é pela arte que nos permita melhorar algo do que nos pertence, mas pela que faculte uma melhoria de nós mesmos.
Alcibíades — Tens razão.
Sócrates — Por outro lado, acaso poderíamos reconhecer a arte que aperfeiçoa os calçados, se não soubéssemos em que consiste um calçado?
Alcibíades — Impossível.
Sócrates — Ou que arte melhora os anéis, se não soubéssemos o que é um anel?
Alcibíades — Não, isto não é possível.
Sócrates — Entretanto, será fácil conhecer-se a si mesmo? E teria sido um homem ordinário aquele que colocou este preceito no templo de Pytho? Ou trata-se, pelo contrário, de uma tarefa ingrata que não está ao alcance de todos?
Alcibíades — Quanto a mim, Sócrates, julguei muitas vezes que estivesse ao alcance de todos, mas algumas vezes também que ela é muito difícil.
Sócrates — Que seja fácil ou não, Alcibíades, estamos sempre em presença do fato seguinte: somente conhecendo-nos é que podemos conhecer a maneira de nos preocupar conosco; sem isto, não o podemos.
Alcibíades — É muito justo.
Platão, Alcibíades, 128d-129
II
— Dize-me Eutidemo, estivestes alguma vez em Delfos?
— Duas vezes, por Zeus!
— Viste, então, a inscrição gravada no templo: conhece-te a ti mesmo?
— Sim, certamente.
— Esta inscrição não te despertou nenhum interesse, ou, ao contrário, notaste-a e procuraste examinar quem tu és?
— Não, por Zeus! Dado que julgava sabê-lo perfeitamente: pois teria sido difícil para eu aprender outra coisa caso me ignorasse a mim mesmo.
— Então pensas que para conhecer quem somos, basta sabermos o nosso nome, ou que, à maneira dos compradores de cavalo que não crêem conhecer o animal que querem comprar antes de haver examinado se é obediente, teimoso...
— Parece-me, de acordo com o que acabas de dizer-me, que não conhecer o próprio valor equivale a se ignorar a si mesmo.
— Os que se conhecem sabem o que lhes é útil e distinguem o que podem fazer daquilo que não podem: ora, fazendo aquilo de que são capazes, adquirem o necessário e vivem felizes; abstendo-se daquilo que está acima de suas forças não cometem faltas e evitam o mau êxito; enfim, como são mais capazes de julgar os outros homens, podem, graças ao partido que daí tiram, conquistar grandes bens e livrar-se de grandes males... Contrariamente, caem nas desgraças.
Xenofonte, Memoráveis, IV, II, 26.
Fonte: SAUVAGE, M. Sócrates e a Consciência do Homem. São Paulo, Agir, 1959.

(Estudo reproduzido do site do Centro Espírita Ismael com a autorização do autor)

sexta-feira, 25 de julho de 2014

Carta aos Meus Amigos Gostar de si mesmo é essencial. Moab José de Araújo e Sousa São Luiz, MA – maio de 2005.


Meus amigos,


Existem pessoas que adoram e até mesmo acham bonito sofrer. Aproveitam qualquer oportunidade para desfiarem um rosário de queixas e de lamentações. Suas dificuldades são as maiores do mundo. Entretanto, não movem um dedo sequer para mudar o curso de suas vidas. Esquecem-se, de que todos – ou quase todos -, sofrem, mas que poucos sabem como sofrer: com resignação.

Assim, tornam-se infelizes, mal-humoradas e pessimistas. Carregam consigo uma aura negativa espalhando tristeza, discórdia, pessimismo e infelicidade por onde passam. Transformam-se em verdadeiras catástrofes ambulantes.
Acreditam – é bem mais fácil para elas -, que os seus infortúnios sejam culpa dos outros, ou da má sorte que as perseguem. Não trabalham seus projetos de vida e têm, como referencial, a felicidade que acreditam outros possam estar desfrutando. Desorientadas, buscam a felicidade em tudo e em todos, menos onde deveriam procurar: nelas próprias.
Ainda não perceberam que os problemas não estão fora, mas dentro delas, bem como as soluções, diga-se de passagem. Que não são os únicos seres humanos a passarem por provações e dificuldades. Que muitos vivem situações iguais ou até mesmo piores. Assim, fechadas em si mesmas, perdem a noção da realidade e da vida, tornando-se profundamente egocêntricas.
Quase sempre, são criaturas que têm uma baixa auto-estima. Não se amam, não acreditam em suas potencialidades, naquilo de que são capazes. E quem não gosta de si mesmo, não gosta de ninguém. Quando disse “Ama a teu próximo como a ti mesmo”, Jesus, em outras palavras, disse: o amor que tens por ti, é o mesmo amor que deves ter pelo teu próximo.
Amar a nós mesmos é aceitar tanto a luz quanto as sombras que em nós existem. Em sua obra, O Ser Fragmentado, o frei Ansel Grün, sobre isso diz: “Aquele que conhece sua sombra lidará com mais cuidado consigo mesmo e questionará mais criticamente suas próprias motivações. Cessará de projetar seus lados de sombra em outros povos ou no vizinho ao lado, e lidará de forma mais benéfica com as pessoas de seu entorno”.
Antes de gostarmos dos outros é necessário gostarmos de nós mesmos. Quando nos amamos, desejamos para nós somente o que é bom, o que faz bem, o que é prazeroso. Estando de bem com nós mesmos, felizes e auto-realizados, passamos a desejar aos outros, também, somente o que for bom e positivo. Felizes, queremos compartilhar com todos a nossa felicidade. 
Em qualquer lugar, seremos sempre aquilo que pensamos acerca de nós próprios - isto é auto-estima. É reconhecer que temos direito à felicidade. Que o nosso destino não é obra do acaso, mas fruto das nossas escolhas.  Não é algo que ganhamos, como uma dádiva ou um castigo, mas sim, algo que conquistamos diariamente. 
Paz para todos!

Artigo recebido com autorização de reprodução

Ecologia e Espiritismo André Trigueiro

É urgente que o movimento espírita absorva e contextualize, à luz da doutrina, os sucessivos relatórios científicos que denunciam a destruição sem precedentes dos recursos naturais não renováveis, no maior desastre ecológico de origem antrópica da história do planeta. Os atuais meios de produção e de consumo precipitaram a humanidade na direção de um impasse civilizatório, onde a maximização dos lucros tem justificado o uso insustentável dos mananciais de água doce, a desertificação do solo, o aquecimento global, a monumental produção de lixo, entre outros efeitos colaterais de um modelo de desenvolvimento “ecologicamente predatório, socialmente  perverso  e  politicamente injusto”.

Na pergunta 705 do Livro dos Espíritos, no capítulo que versa sobre a Lei de Conservação, Allan Kardec pergunta: “Porque nem sempre a terra produz bastante para fornecer ao homem o necessário?”, ao que a espiritualidade responde: “É que, ingrato, o homem a despreza! Ela, no entanto, é excelente mãe. Muitas vezes, também, ele acusa a Natureza do que só é resultado da sua imperícia ou da sua imprevidência. A terra produziria sempre o necessário, se com o necessário soubesse o homem contentar-se” (...).

É evidente que em uma sociedade de consumo, nenhum de nós se contenta apenas com o necessário. A publicidade se encarrega de despertar apetites vorazes de consumo do não necessário ­ daquilo que é supérfluo, descartável, inessencial ­ renovando a cada nova campanha a promessa de felicidade que advém da posse de mais um objeto, seja um novo modelo de celular, um carro ou uma roupa. Para nós espíritas, é fundamental que o alerta contra o consumismo seja entendido como uma dupla proteção: ao meio ambiente ­ que não suporta as crescentes demandas de matéria-prima e energia da sociedade de consumo, onde a natureza é vista como um grande e inesgotável supermercado – e ao nosso espírito imortal, já que, segundo a doutrina espírita, uma das características predominantes dos mundos inferiores da Criação é justamente a atração pela matéria. Nesse sentido, não há distinção entre consumismo e materialismo, e nossa invigilância poderá custar caro ao projeto evolutivo que desejamos encetar. Essa questão é tão crucial para o Espiritismo, que na pergunta 799 do Livro dos Espíritos, quando Kardec pergunta “de que maneira pode o Espiritismo contribuir para o progresso?”, a resposta é taxativa: “Destruindo o materialismo, que é uma das chagas da sociedade.(...)”

Uma das mais prestigiadas organizações não governamentais do mundo, o Worldwatch Institute, com sede em Washington, divulga anualmente o relatório “Estado do Mundo”, uma grande compilação de dados e estudos científicos que revelam os estragos causados pelo atual modelo de desenvolvimento. Na última versão do relatório, referente ao ano de 2004, afirma­se que “o consumismo desenfreado é a maior ameaça à humanidade”. Os pesquisadores do Worldwatch denunciam que “altos níveis de obesidade e dívidas pessoais, menos  tempo  livre  e  meio  ambiente  danificado  são  sinais  de  que  o  consumo excessivo está diminuindo a qualidade de vida de muitas pessoas”.

Aos espíritas que mantém uma atitude comodista diante do cenário descrito nessas breves linhas, escorados talvez na premissa determinista de que tudo se resolverá quando se completar a transição da Terra (de mundo de expiações e de provas para mundo de regeneração) é bom lembrar do que disse Santo Agostinho no capítulo III do Evangelho Segundo o Espiritismo. Ao descrever o mundo de regeneração, Santo Agostinho diz que mesmo livre das paixões desordenadas, num clima de calma e repouso, a humanidade ainda estará sujeita “às vicissitudes de que não estão isentos senão os seres completamente desmaterializados; há ainda provas a suportar (...)” e que “nesses mundos, o homem ainda é falível, e o Espírito do mal não perdeu, ali, completamente o seu império. Não avançar é recuar, e se não está firme no caminho do bem, pode voltar a cair nos mundos de expiação, onde o esperam novas e terríveis provas”. Ou seja, não há mágica no processo evolutivo: nós já somos os construtores do mundo de regeneração, e, se não corrigirmos o rumo na direção  do  desenvolvimento  sustentável,  prorrogaremos  situações  de  desconforto  já amplamente diagnosticadas.

Não é possível, portanto, esperar a chegada do mundo de regeneração de braços cruzados. Até porque, sem os devidos méritos evolutivos, boa parte de nós deverá retornar à esse mundo pelas portas da reencarnação. Se ainda quisermos encontrar aqui estoques razoáveis de água doce, ar puro, terra fértil, menos lixo e um clima estável ­ sem os flagelos previstos pela queima crescente de petróleo, gás e carvão que agravam o efeito estufa – deveremos agir agora, sem perda de tempo. Depois que a ONU decretou que 2003 seria o ano internacional da água doce, os católicos não hesitaram em, pela primeira vez em 40 anos de Campanha da fraternidade, eleger um tema ecológico: “Água: fonte de vida”. Mais de 10 mil paróquias em todo o Brasil foram estimuladas a refletir sobre o desperdício, a poluição e o aspecto sagrado desse recurso fundamental à vida. E nós espíritas? O que fizemos, ou o que pretendemos fazer? O grande Mahatma Gandhi ­ que afirmou certa vez que toda bela mensagem do cristianismo poderia ser resumida no sermão da montanha – nos serve de exemplo, quando diz “sejamos nós a mudança que nós queremos ver no mundo”

quinta-feira, 24 de julho de 2014

Comportamento e Participação Octávio Caúmo Serrano

O que é uma reunião espírita? O que aprendemos e o que recebemos enquanto estamos no Centro?

Resumidamente, podemos dizer que uma reunião espírita é o momento em que sintonizamos com os Espíritos. Nasce uma ligação entre eles e nós pela afinidade que criamos nesse contato.

Sendo assim, podemos escolher o que desejamos obter quando vamos ao Centro Espírita: sair dali fortalecidos, serenados, dar nossa contribuição para que o ambiente fique em harmonia, ou ser agente de perturbação, propositada ou involuntariamente.

Contribuímos para que o ambiente fique tenso quando nos recusamos a seguir a disciplina, que é sempre produto de muito estudo dos dirigentes. Não respeitamos horários, não nos comportamos conforme as normas da casa, queremos regalias e externamos gestos para sobressair, sem cultivar a modéstia e a humildade.

Mas não é só quando o fazemos propositadamente que perturbamos o ambiente espiritual do Centro Espírita. Há muitas atitudes, aparentemente sem importância, que contribuem para desviar a atenção das pessoas.

Vejam algumas:

Dirigimo-nos ao centro em trajes impróprios para o ambiente. Os homens de regata, de short, de chinelo, por exemplo. As mulheres de curtíssimas minissaias, decotes, barriga e costas de fora. Com tal comportamento, despertamos nas pessoas suas paixões inferiores. 

Nada, nem o calor,  é desculpa para ir à reunião nessas condições. 

A espiritualidade que se reúne no centro é formada por espíritos e pessoas com certo equilíbrio, mas também por perturbados espirituais; encarnados e desencarnados. Uns querem ajudar e outros vão lá para buscar socorro ou criar problemas.

Se em vez de concentrar na prece,  na leitura, na aula ou na palestra, para estabelecer ligação com o plano espiritual do Bem, ficamos ligados às pessoas e aos seus trajes insólitos, desviaremos a atenção do principal. Em tais circunstâncias, nossa sintonia será com espíritos igualmente sensuais e atrasados, o que pode produzir um processo de obsessão.

O mesmo se dá quando bocejamos, conversamos, olhamos no relógio, dormimos, tiramos o sapato, chacoalhamos a perna, batemos o pé, mexemos no cabelo, roemos as unhas...  São manias e inquietações que nos afastam do objetivo da reunião, além de desconcentrar os outros. Ninguém sai ganhando. Estivemos ali fisicamente, mas não aproveitamos nem o tempo gasto com a ida ao Centro.
Numa reunião evangélica é importante fazer silêncio: físico, mental e espiritual fiscalizando até os pensamentos. Se assim não for, a finalidade não se cumpre; a presença física, simplesmente, nada acrescentará ao espírito.  

Pense nisso, mas pense com muita seriedade!


Artigo publicado na Tribuna Espírita, Paraíba, edição de Janeiro/Fevereiro de 2005 e reproduzido com autorização do autor

quarta-feira, 23 de julho de 2014

Cidadania Orson Peter Carrara


Cidadão é o indivíduo que habita uma cidade, em gozo dos direitos civis e políticos. Já o direito é a faculdade de deixar ou de praticar algo; é ainda o conjunto de leis e regras.
 
Cidadania é qualidade do cidadão. Em outras palavras, o modo de ser, sua aptidão e disposição moral para agir em favor da sociedade que integra.
 
As duas definições abrem perspectivas de entendimento, mostrando a sintonia entre si e a influência recíproca que se exercem mutuamente, já que pelo cidadão se constrói a cidadania e esta influi no cidadão. Fica, portanto, evidente que do papel do cidadão se constrói uma sociedade equilibrada (entenda-se justa e fraterna), que por sua vez proporciona dignidade à vida do cidadão. Isto é cidadania. 
 
Atualmente fala-se muito em Terceiro Setor. O que é terceiro setor?
 
É que a sociedade divide-se em tres setores de atuação: o Primeiro é o governo, responsável pela ordem social e condução da nação, através de seus diversos órgãos; o Segundo é o setor privado, constituído das empresas que fomentam a produção industrial, o comércio e os serviços e movimentam a economia, inclusive empregando os cidadãos; já o Terceiro é constituído por organizações sem fins lucrativos, normalmente com objetivos educativos, assistenciais, culturais, recreativas, inclusive de amparo à saúde e às minorias sociais em suas diversas facetas; e as chamadas ONG's - as chamadas organizações não governamentais.
 
Estão enquadradas neste setor as fundações, as empresas com responsabilidade social, as próprias pessoas físicas e as entidades beneficentes (que diga-se de passagem, socorrem o país na grave extensão de suas questões sociais).
 
E aí surge a figura do voluntário: aquele que doa seu tempo, seu talento, de maneira espontânea e não remunerada, para causas de interesse social e comunitário. É uma forma muito positiva de atuação social que caracteriza também a cidadania.
 
O trabalho voluntário surgiu no Brasil em 1543, com a fundação da Santa Casa de Misericórdia de Santos. Depois vieram a LBA (1942); as APAEs (1961); o Projeto Rondon (1967); a Pastoral da Criança (1983) e a Ação da Cidadania, de Betinho (1993). No âmbito internacional, em 1863 e 1908, surgiu a Cruz Vermelha e em 2001 a ONU declarou aquele ano como o Ano Internacional do Voluntariado.
 
Estamos a relatar estes fatos e a comentar o assunto porque a cidadania reflete a valorização da vida e a promoção da dignidade humana, tão esquecida dos dias atuais. Em última análise é fruto da solidariedade, que por sua vez, é filha do AMOR. Ah! o amor! Somente ele é capaz de interessar-se pelas dificuldades alheias; somente o amor é capaz de sair do comodismo, da indiferença, do egoísmo feroz que gera a violência, e voltar-se para o difícil quadro social de idosos, carentes de toda ordem, meninos de rua, drogados, alcoólatras, orfãos, mães solteiras, analfabetos, desempregados, enfermos em geral. Somente o amor é que move suas ações para a educação/profissionalização de jovens, para a preservação do meio ambiente, para doação de sangue, distribuição de livros, merenda ou sopão, ou se oferecem como voluntários nos plantões do CVV ou campanhas de vacinações, entre tantas outras iniciativas de promoção e dignidade humanas.
 
Isto tudo para dizer que somente tres caminhos podem evitar a dor social (ou difícil quadro de dificuldades enfrentado atualmente):

a) uma consciência reta do cidadão;
b) um coração que ame;
c) mãos operosas no bem.

É preciso acrescentar algo?


(artigo obtido do site do Portal do Espírito e reproduzido com a autorização do Autor)