quinta-feira, 30 de junho de 2016

Renúncia

Não pode haver progresso integral sem renúncia. A obra do aperfeiçoamento do nosso Espírito é urdida de renúncias sob aspectos multiformes. Não há caráter consolidado que se não funde numa série de renúncias. Quem não sabe renunciar, jamais firmará as bases seguras de sua evolução. Renunciar é vencer, vencer é viver. A redenção é impraticável fora da órbita das renúncias: só nesse ambiente o Espírito conquista a liberdade e firma o seu império.
O homem é um animal que se espiritualiza. Veio do império dos instintos, e caminha para o reinado da razão. O desenvolvimento harmônico dos atributos do Espírito – inteligência, razão, vontade e sentimentos – determina naturalmente o recuo do instinto. À medida que o Espírito assegura seu poder, a animalidade se restringe. Semelhante transição, de um para outro reino, é obra da renúncia.
O instinto representa o domínio da carne; a razão, o do Espírito. Há estágios na vida dos seres em que o instinto tem a primazia: época da irracionalidade. Outros há em que o despotismo do instinto constitui a fonte de todos os males: ciclo racional. O animal tem no instinto o seu guia. Para o homem o guia deve ser a razão. Sempre que esta fraqueja, cedendo lugar àquele, o homem erra e sofre. Erra porque se deixa arrastar, tendo já o leme e a bússola para orientar-se, ao sabor das vagas que o desviam do roteiro normal da vida. Sofre, porque o erro é causa cujo efeito é a dor.
O instinto não reúne os requisitos necessários para satisfazer as aspirações do Espírito, antes constitui-lhe embaraço. Daí a necessidade de restringi-lo, impondo limites cada vez mais restritos às suas exigências. E isto só se consegue pela renúncia.
A grande maioria dos homens vegeta entre duas tiranias: uma que atua no seu interior, e se denomina instinto; outra que age de fora para dentro, e se chama sentidos. Subjugado pelo instinto e fascinado pelos sentidos, o homem torna-se um ser híbrido, incoerente e extravagante, capaz de todas as aberrações. Só a renúncia, jugulando a cobiça e refreando os instintos, poderá quebrar os grilhões desse duplo e aviltante cativeiro.
É o que S. Paulo aconselha em sua epístola aos Romanos, sob os seguintes dizeres: “Rogo-vos, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos corpos como um sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, pois em tal importa o culto racional; e não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que proveis qual é a boa, agradável e perfeita vontade de Deus.”
Para que o nosso corpo seja um sacríficio vivo em oferenda perpétua, é indispensável manter aceso o fogo da renúncia na imolação do instinto e da cobiça.
“Se alguém vem a mim e não renuncia a seu pai, mãe, mulher, filhos, irmãos e irmãs, e ainda à sua própria vida, não pode ser meu discípulo… Assim, pois, todo aquele que dentre vós não renuncia a tudo que possui, não pode ser meu discípulo. Quem tem ouvidos de ouvir, ouça”.
Sempre que o incomparável Mestre fechava seus discursos com a frase – quem tem ouvidos de ouvir, ouça – queria, com isso, dizer: quem for capaz penetre o sentido destas palavras, porque o meu ensino não está na letra que mata, mas no espírito que vivifica. O trecho, acima inscrito, acha-se em tais condições.
Jesus tinha o lar e a família na mais alta consideração. Segundo seu modo de ver, no lar e na família se consubstanciavam os maiores bens, aqueles a que o homem se achava mais intimamente ligado. Daí citar precisamente o lar e a família, ao lado da própria vida, como os objetos que fazem jus aos nossos maiores afetos e ao nosso mais profundo e radicado apego.
Todavia, esses tesouros devem ser renunciados quando constituam embaraços á obra da redenção de nossos Espíritos.
Mas, afinal, de que consta essa renúncia e como deve ser executada? Aqui cumpre lembrar a observação do Senhor: Quem tiver ouvidos de ouvir, ouça.
A renúncia, tal como Jesus a estabelece, não significa, no que respeita à família, o seu abandono nem o arrefecimento do afeto que une os corações destinados a viverem sob o mesmo teto; e no que concerne aos bens temporais, a renúncia não importa tão-pouco em abrirmos mão de tudo que possuímos, transformando-nos em párias ou mendigos.
Renúncia, segundo o critério evangélico, quer dizer capacidade moral, força de caráter capaz de sobrepor, em qualquer emergência ou conjuntura, a causa da justiça e da verdade acima de todos os interesses, de todas as volições e prazeres, e mesmo acima das nossas mais legítimas e caras afeições. Tal é a condição – sine qua non – estabelecida por Jesus para nos tornarmos seus discípulos.
Esta importantíssima questão tem sido mal interpretada pela teologia de certos credos cristãos. Do estrabismo teológico nasceram os conventos. Os reclusos das celas supõem, com isso, apressar o dia da redenção de suas almas. Enganam-se redondamente, pois, antes, retardam a aurora desse dia glorioso. Não é fugindo da sociedade e se isolando egoisticamente entre as paredes de um cubículo que aceleraremos a evolução dos nossos Espíritos. Os trânsfugas perdem oportunidade de avançar, na senda do progresso, porque evitam as lutas. É enfrentando os nossos inimigos, dentre os quais a morte é o derradeiro a vencer, no conceito de Paulo, que caminharemos com passo seguro na conquista do porvir.
Os tabernáculos eternos não se abrem com gazua. E que pretendem os habitantes do claustro senão abri-los com chave falsa? Os instintos amortecidos pelos cilícios e pelos jejuns contínuos não foram vencidos, não foram subjugados; acham-se apenas impossibilitados de ação mediante processos anormais, e, portanto, condenáveis. A virtude de convento é como a planta de estufa: só medra a coberto das intempéries.
Não é tal a renúncia ensinada por Jesus, que deu os mais inequívocos exemplos se sociabilidade, convivendo com os pecadores, tomando parte nos seus jantares, bodas e festins, a despeito mesmo das censuras acrimoniosas do farisaísmo que cobria de apodos por isso.
A filha deixa seus pais, que abandona o lar e a sociedade para sepultar-se num convento, comete um ato de fanatismo. Ela não renunciou a pai, mãe, irmãos, irmãs e a tudo quanto tem, no sentido em que o divino Mestre preceitua; ela deixou de cumprir o seu dever junto da família e da sociedade, fugindo às lutas e às vicissitudes da vida humana e social. O arrefecimento e o repúdio às afeições de família, conseqüentes ao enclausuramento, são antes delito que virtude. Já dizia o apóstolo João, sabia e judiciosamente: Se não amas a teu irmão que vês, como amarás a Deus que não vês?
O que Jesus pede não é o desafeto aos membros de nossa família; não é o repúdio do lar, essa mansão sagrada onde se forjam as virtudes fundamentais do Cristianismo; não é a abstinência de tudo o que nos alegra, conforta e refrigera a alma; não é a privação do conforto, do bem-estar e da independência material ou financeira; não é o estrangulamento de todas as aspirações do melhor por que nosso “ser” naturalmente anela, porque isso seria uma monstruosidade, seria a nossa morte moral como efeito do embrutecimento, da abulia a que condenássemos nosso espírito.
O que Jesus requer dos seus discípulos é, como já ficou dito acima, a coragem moral, a disposição de ânimo capaz de resistir a todas as seduções do mundo, colocando acima de tudo, inclusive de nossos mais santos afetos e da nossa própria vida, o ideal da justiça e de amor que sua doutrina encerra e do qual ele mesmo é o símbolo e o exemplo.
Fonte: Livro “Em Torno do Mestre” – Vinicius – Federação Espírita Brasileira (Casa-Matér do Espiritismo) Ano de Edição:  1939 – páginas: 38 até 42.

quarta-feira, 29 de junho de 2016

O Reino de Deus

Tendo os fariseus perguntado a Jesus quando viria o reino de Deus, ele respondeu: O reino de Deus não vem com mostras exteriores. Por isso ninguém poderá dizer: ei-lo aqui, ou ei-lo acolá, pois o reino de Deus está dentro de vós.
Concluímos da resposta do Mestre que o reino de Deus está em nós próprios. Não obstante, é ele mesmo quem assim nos adverte: Buscai em primeiro lugar o reino de Deus e a sua justiça; tudo o mais vos será dado por acréscimo. Como ? Buscar aquilo que está em nós? E depender dessa pesquisa todo o nosso bem?
A explicação nos é dada pela seguinte parábola: O reino de Deus é semelhante a um tesouro oculto no campo, que foi encontrado por um homem, o qual, movido de grande gozo, foi vender tudo que possuía e adquiriu aquele campo.
Agora podemos entender: o reino de Deus está em nosso Espírito mesmo, porém oculto e ignorado. Possuir e ignorar que possui, equivale a não possuir. Ter e não saber que tem, é como se não tivesse. Daí a necessidade de procurá-lo. E, pelo dizer da semelhança, é de inestimável valor esse tesouro ou reino de Deus. Tanto assim, que todo aquele que o descobre, coloca-o desde logo acima de tudo o mais. Este asserto é corroborado por outra parábola : O reino de Deus é semelhante a um negociante de pérolas que, encontrando uma de subido valor, foi vender tudo o que possuía e a comprou.
Já sabemos algo de importante sobre o caso. Mas, que será, afinal, o reino de Deus e que idéia devemos fazer desse tesouro oculto em nosso Espírito? O reino de Deus é o conjunto de energias e faculdades que jazem latentes em nossa alma. E’ o reino da vida, da imortalidade e do poder, do qual só nos apercebemos depois que começamos a sentir em nós as vibrações da vida espiritual, cuja atividade se exerce através do amor e da justiça, empolgando nosso ser. Que é, de fato, o reino da força que tudo vence, nos diz este outro apólogo: O reino de Deus é semelhante a uma semente de mostarda, que um homem semeou no campo. Esta semente é, na verdade, a menor de todas; mas, depois de haver crescido, é a maior de todas as hortaliças, e se faz árvore, de sorte que as aves do céu fazem ninhos em seus ramos. Tal é como o Mestre revela a incomparável energia de ação e de expansão que se esconde no reino de Deus. E que essa ação se verifica através do sentimento da justiça, sabemos por esta admoestação do Senhor: Se a vossa justiça não for superior à dos escribas é fariseus, não possuireis o reino de Deus.
O roteiro, portanto, que conduz ao tesouro oculto é um só: o cumprimento do dever, a prática do bem, a conduta reta. “Nem todo o que me diz Senhor! Senhor! entrará no reino de Deus, mas somente aqueles que fizerem a vontade de meu Pai. Naquele dia, muitos me dirão: Senhor, em teu nome nós profetizamos, expelimos demônios e obramos maravilhas. Mas eu lhes direi abertamente: Não vos conheço; apartai-vos de mim, vós que vivestes na iniqüidade.” E o Rei, então, dirá: Vinde, benditos de meu Pai; possuí como herança o reino que vos está destinado desde a fundação do mundo. Pois tive fome e me destes de comer; tive sede e me destes de beber; era forasteiro, e me recolhestes; estava nu, e me vestistes; enfermo e preso, e me visitastes. Então, perguntarão os justos: Quando, Senhor, te vimos com tais necessidades e te assistimos? E o Rei retrucará:” Em verdade vos digo que quantas vezes o fizestes a um dos meus irmãos mais pequenos, a mim o fizestes.”
Sabemos então, já, o que é o reino de Deus, onde se oculta, e o que nos cumpre fazer para possuí-lo.
LIVRO: EM TORNO DO MESTRE
AUTOR: PEDRO DE CAMARGO – PSEUDÔNIMO VINICIUS
EDITORA: FEDERAÇÃO ESPÍRITA BRASILEIRA – 6ª EDIÇÃO – BRASILIA – DF
ANO DE PUBLICAÇÃO: 1939 (PAG. 204 – 206).

terça-feira, 28 de junho de 2016

A Impessoalidade do Exercício Mediúnico

Quando procuramos um médium, não procuramos por ser Rita, Maria ou José. Buscamos determinadas qualidades que tornam o médium mais apto à tarefa que se apresenta. Buscamos, entre os médiuns da mesa, o perfil mais apropriado. Servimo-nos daquele que melhor se adapta à necessidade do momento.
Neste sentido é que dizemos que as ligações mediúnicas mais saudáveis são impessoais.
Se nos ligamos afetivamente aos médiuns com que trabalhamos? Claro! Mas não lhe somos exclusivos, nem ele o é para nós, e não hesitaremos em buscar outro medianeiro mais qualificado para um mister diferente, se esta providência se mostrar cabível.
Espíritos que se ligam aos médiuns por motivos pessoais existem, e não são poucos. Haja vista, toda a gama dos obsessores e subjugadores. Também as afinidades estabelecidas em existências anteriores poderão facilitar o contato com estas criaturas. Mas o bom médium não vive de ligações pessoais com almas familiares ou simpáticas. Ele busca, no estudo e autoconhecimento aliados à humildade, a possibilidade de ser mais útil a uma variedade maior de Espíritos e eficiente numa diversidade de situações.
Aliás, se fazemos alguma distinção com relação aos médiuns é no que tange ao desenvolvimento destas virtudes:
  • o estudo sincero e o empenho real em aprender sobre a mediunidade e as leis espirituais;
  • o conhecimento de si mesmo que diminui a possibilidade de ser enganado por suas próprias fraquezas;
  • a humildade, que evita interferências personalistas do orgulho e da vaidade.
Se existe um médium para preferirmos exclusivamente como instrumento e, não, como ser humano, é este.
Acostume-se, portanto, o médium a não tomar como pessoais as ligações que se estabelecem na reunião, a não se tornar defensor ou acusador da criatura necessitada que o procura para fins de reajustamento íntimo, nem se considere agraciado pela chance de ser intermediário de palavras sublimes.
A prudência pede que se abstenha de comentários que denunciem preferências ou antipatias por esta ou aquela entidade comunicante. O amor abraçará a todos, na medida em que aumentar dentro de nós.
Entregar-se ao serviço mediúnico com bondade e sem acúmulo de expectativas sobre o próprio desempenho e sobre as comunicações recebidas é a melhor maneira de não se ver surpreendido, mais tarde, pela fileira dos equívocos de julgamento.
Quando, na sua tarefa habitual, o médium consegue igualmente se desprender de suas exigências e maneirismos pessoais, quando consegue relevar seu desejo de atender somente a determinada faixa de Espíritos em benefício da experimentação e do socorro às criaturas em sofrimento, torna-se facilitador do próprio aprendizado e desenvolvimento.
Quando, ao contrário, fecha-se no limite de mimos e idiossincrasias é ele, mais que qualquer outro, quem perde a oportunidade da lição presente na experiência.
No silêncio de sua alma, cada um sabe o que pode ou não fazer com sua faculdade sem prejudicar a saúde física e emocional. Que ninguém se prejudique com o pretexto de servir, e recorra aos Espíritos orientadores para esclarecer-se e assegurar-se do que é apropriado a cada momento. Mas também, que ninguém se negue a possibilidade de tentar algo novo, por preconceitos ou receios sem maior justificativa que os próprios preconceitos.
Que ninguém busque os louros da glória entre os homens, porque no ponto mais alto do exercício mediúnico encontram-se a abnegação e o desinteresse.
Entender a mediunidade como a moeda recebida em confiança na parábola dos talentos; aplicá-la, não exclusivamente segundo nossos gostos, mas segundo as necessidades da vida; investi-la sem medo, mas com bom senso, e sem distribuição indiscriminada dos seus bens, tudo isto são responsabilidades de todo bom médium.
Unicamente o discernimento e a humildade conferem parâmetros seguros a este exercício, discernimento e humildade que não podem conviver com o personalismo.
Autores: Werneck / Rita Foelker
Site: Luz do Espiritismo – Grupo Espírita Allan Kardec

segunda-feira, 27 de junho de 2016

A Moral Mediúnica

O fato de Kardec considerar que a Mediunidade não depende da Moral, pois se relaciona com o corpo, serviu de motivo para explorações dos inimigos gratuitos do Espiritismo, que passaram a proclamar a falta de moral no Espiritismo. A afirmação kardeciana se confirma nas pesquisas atuais da Parapsicologia, como já se confirmara nas pesquisas da Metapsíquica. Nas experiências espíritas posteriores a Kardec também se confirmou essa distinção. E isso porque, como se vê rio Livro dos Médiuns, a mediunidade não é uma graça ou dom especial concedido a criaturas privilegiadas, mas uma faculdade humana como as demais. A moral do médium determina o seu comportamento como criatura humana e regula as suas relações com os espíritos. A questão moral não surge da faculdade mediúnica, mas da sua consciência. Não se pode dizer que um médium entregue as práticas maldosas ou a objetivos condenáveis, contrários ao senso moral, não seja médium Assim como há criaturas boas e más na Terra, há espíritos maus e bons que com elas se afinam e se servem da sua mediunidade para fins maus ou bons. Se o médium sem moral se corrigir e passar a portar-se pelos princípios morais, passará a servir aos espíritos bons através da sua mesma mediunidade. Assim acontece com todas as faculdades humanas. O homem pode aplicar a sua inteligência para o mal ou para o bem, mas a sua inteligência é sempre a mesma, quer atue num ou noutro campo. A maldade da linguagem não depende da língua, mas da mente que a usa. O mesmo acontece com todas as faculdades humanas.
O que gerou esse mau entendimento do ensino de Kardec foi a crença ingênua de que Deus só concede benefícios a criaturas santificadas, quando os fatos nos mostram o contrário: as criaturas más, perversas e viciadas são as que mais recebem os benefícios de Deus, que deseja desviá-las de seus erros pela transformação da consciência e não pela força, pois através desta a transformação seria forçada e não natural, espontânea e verdadeira. Deus nos corrige através de suas leis, tanto as leis naturais quanto as leis morais, que devemos conhecer os seus efeitos na própria experiência com elas. Na sua misericórdia, concede boas faculdades aos maus para que eles aprendam a ser bons. Se através das boas faculdades praticarem o mal, receberão a paga fatal de seus atos nas conseqüências da maldade praticada.
Quanto à ligação da mediunidade com o corpo, que muitos espíritas não entenderam, confundindo-a com uma suposta origem orgânica da mediunidade, trata-se de coisa muito diferente disso. A mediunidade está ligada ao corpo pelo espírito que a ele se liga, mas não pertence ao corpo e sim ao perispírito, que enquanto estivermos encarnados faz parte do corpo e permite a ligação do espírito comunicante com o perispírito do médium. É o grau maior ou menor da possibilidade de expansão das energias perispirituais no corpo do médium que deter-mina a maior ou menor flexibilidade do médium na recepção das comunicações. Quando os espíritos dizem que a mediunidade, que a faculdade mediúnica liga-se ao organismo e independe da moral, confirmam a posição de Kardec. O perispírito controla o organismo como provaram as pesquisas soviéticas das funções do corpo bioplásmico do homem. O moral, mais acentuadamente na língua francesa do que na portuguesa, representa o conjunto das atividades mentais e psíquicas da criatura. É evidente que a dependência orgânica da mediunidade decorre da ligação espírito-corpo, através do perispírito. Quando falamos, usamos o equipamento fônico do corpo para uma comunicação mental, que não é de ordem orgânica, tanto que, nas manifestações mediúnicas e nas experiências telepáticas atuais, a voz do espírito (de morto ou de vivo) identifica-se pela sua tonalidade e timbre, que o desaparecimento do aparelho vocal na morte não permitiria repetir-se.
A existência da mediunidade, determinando mudanças no comportamento dos médiuns, necessariamente dá origem à Moral Mediúnica. Sabemos que a Moral é um sistema de regras ou normas de conduta, derivadas dos costumes e das tradições de uma determinada cultura Os costumes derivam, por sua vez, das necessidades de ordem e respeito humano das estruturas sociais. isso levou os materialistas a considerarem a Moral como simples mecanismo de manutenção e defesa da sociedade variando de povo para povo, não raro de maneira contraditória. Não passa de uma convenção pragmática. Mas os estudos mais profundos de Bergson e outros mostraram que Moral e Religião são formas de projeção das exigências da consciência nas estruturas sociais. A negação materialista da Moral Absoluta e a negação positivista da Moral Metafísica tiveram então de enfrentar a tese bergsoniana da Moral Consciencial. A Moral existe como absoluta e metafísica nas aspirações de ordem, justiça, beleza e bondade dos anseios humanos de transcendência. Em sentido geral, podemos dizer que a Moral é a busca da realização do Bem na Terra. Não seria possível que uma doutrina de elevação e aprimoramento do homem, como o Espiritismo deixasse de produzir um tipo de Moral. O aparecimento da Moral Mediúnica logo se fez sentir, orientada nos rumos superiores da Moral Cristã. Mas se esta, assim chamada, desviou-se em muitos pontos da Moral do Cristo, a Moral Mediúnica agiu no sentido de reação espiritual para o restabelecimento da Moral Evangélica. É sobretudo no Livro dos Espíritos e no Evangelho Segundo o Espiritismo que encontramos as leis da Moral Mediúnica. A comprovação científica da sobrevivência do homem após a morte, através da Mediunidade, mostrou a relação direta existente entre Mediunidade e Moral e, portanto, entre Espiritismo e Moral. O médium tem, nos princípios de moral, as normas ideais da sua orientação no mundo. Se as conhecer e seguir, sua mediunidade será altamente benéfica, posta a serviço dos Espíritos Superiores, seja no campo da assistência aos espíritos inferiores desencarnados e encarnados, seja na área das atividades doutrinárias de ordem social ou especificamente no plano cultural da transformação dos conhecimentos humanos, para a compreensão espiritual da vida. A transformação do mundo se faz pela conversão. Não se trata da conversão a unia seita, a um tipo especial de fé, mas da conversão dos valores mundanos em valores espirituais. O médium é um servidor do espírito e para servi-lo terá de integrar-se nas condições espirituais que traz em si mesmo, na sua essência humana. O próprio desenvolvimento da mediunidade lhe ensina isso. As funções mediúnicas mudam a direção do seu campo visual e perceptivo. Ele se desliga se desimanta da realidade mundana para focalizar em sua sensibilidade as perspectivas do espírito. Essa esquizofrenia divina caracteriza os estágios superiores da evolução anímica em que a realidade concreta se converte na abstração das idéias, dos conceitos, dos sonhos, dos anseios utópicos. O sonho dos poetas e artistas e a utopia que leva os mártires ao suplício são os primeiros sinais do alvorecer da mediunidade na esteira da reencarnação. O espírito sobe do sensível platônico (do concreto) para o inteligível (o abstrato) que é a visualização das essências. Por isso Platão, nos seus últimos anos, sentia-se incapaz de transmitir em palavras as percepções do seu mundo das idéias. E por isso Paulo de Tarso, que imantado às tradições violentas do Judaísmo, perseguia o Cristo, ao receber o impacto da existência espiritual do Mestre, na Estrada de Damasco, desliga-se do mundo de falsas imagens em que vivia, perde a visão das coisas e mais tarde a recobra num ângulo superior, com os passes de Ananias, convertendo-se ao Cristianismo nascente. O desenvolvimento espiritual de Paulo o leva, naquele instante, à conversão cristã pelo batismo do espírito, nas águas invisíveis da mediunidade. Dali por diante ele será inspirado por Estevão, o mártir que ele mandou lapidar na sua loucura mundana. Tudo se converte ao seu redor, o mundo em que passa a viver não é mais o da arrogância e da brutalidade, mas o mundo da abnegação e da humildade. O Doutor da Lei converte-se em aprendiz e servo da realidade cristã.
A mecânica da conversão é irreversível, porque decorre de um processo de amadurecimento psíquico, no desenvolvimento das potencialidades do espírito.
As potencialidades desenvolvidas elevam o grau consciencial da criatura e alargam o seu campo visual e perceptivo. O convertido, como aconteceu com Paulo, despem-se de todo o seu passado, mesmo à custa dos maiores prejuízos no plano material e mundano, para integrar-se numa compreensão superior da realidade. Só podem regredir os pseudoconvertidos do formalismo religioso, da dogmática artificial das igrejas, que nada mais fazem do que trocar de dogmáticas, sem tocar nem de leve a fímbria da Verdade. O poder do Evangelho vivo e puro é semelhante ao do sol, que amadurece os frutos sem que estes possam voltar à condição de verdes. Daí a razão do ensino de Kardec no tocante à inconveniência do proselitismo forçado. Que cada qual fique onde está, na escala evolutiva das crenças religiosas, pois o conhecimento espiritual requer tempo e maturação de cada criatura. Assim sendo individualmente, também o é coletivamente. O mundo só pode completar a sua conversão, iniciada pelo Cristo, quando estiver maduro para isso Não obstante, não temos o direito de cruzar os braços ante as dores do mundo. Nosso dever é trabalhar incessantemente para que a concepção espírita, o que vale dizer o ideal cristão em sua pureza primitiva, esteja sempre ao alcance de todos, particularmente das novas gerações.
A Moral Mediúnica não é simples repetição dos preceitos evangélicos usados pelas religiões na medida de suas conveniências e aplicadas a sociedades no resguardo de seus interesses. É a moral total ensinada e vivida por Jesus, interpretada em profundidade e sem temor pelos que realmente a compreenderam como vemos no exemplo de O Evangelho Segundo o Espiritismo. Kardec desvestiu os Evangelhos de todos os adereços mitológicos e supersticiosos dos textos clássicos (escritos no clima da Era Mitológica) para destacar apenas o ensino morai do Cristo, que é a essência de toda espiritualidade verdadeira. Nada de aparatos e fantasias, nada de simbologias misteriosas, apenas a verdade clara dos princípios, e estes desenvolvidos em todas as suas possibilidades de aplicação.
Não são rígidos os princípios da verdadeira Moral Cristã. São claros e flexíveis, dessa flexibilidade funcional que permite a sua aplicação nos mais variados aspectos da existência. O princípio do Amor é o centro luminoso desse leque de conceitos que se abrem nas dimensões da consciência. Dele parte a normativa de todos os demais princípios. A antiga atitude de suspeita e desconfiança em relação aos outros, quando não de repúdio e hostilidade, transforma-se em simpatia e acolhimento para todas as criaturas. O médium é afável e serviçal, pois conhece os deveres da fraternidade ativa no trato com a imensa irmandade humana. Amar aos inimigos era um absurdo, uma idéia louca para a Antigüidade. Perdoar indefinidamente aos que erram parecia um incentivo ao erro, um estímulo ao crime. Dar a face direita ao que bateu na esquerda, uma prova de covardia ou insanidade. Dar a capa também ao que nos pede o vestido, uma prodigalidade tola e perigosa. Acertar o passo com os adversários nos caminhos do mundo, uma imprudência suicida. Suportar com paciência os que nos ofendem e perturbam nada menos do que entregar-se ao abuso dos atrevidos. Livrar-se dos excessos da fortuna para não ser ladrão dos que nada possuem uma forma perdulária de incitar à preguiça, à malandragem. Aconselhar aos rebeldes a não-violência, uma forma indigna de aprovar o direito da força. Não cobiçar as posses alheias, uma asfixia do poder de conquista. Manter a firmeza das palavras: sim, sim; não, não, uma carência de habilidade e astúcia. Não roubar, não mentir, não cultivar a hipocrisia e a traição, uma traição a si mesmo. Ser sincero, não enganar nem fraudar, o caminho da derrota e da miséria.
Todos esses princípios de uma conversão estúpida forçaram os homens apegados ao mal e ao egoísmo a procurar os meios falaciosos de fraudá-los. E dessa fraude universal do direito e da verdade surgiram os anti-evangelhos das concessões igrejeiras com o rendoso comércio das indulgências. A Moral Cristã reverteu-se na moral dos homens devorados pelos instintos ferozes da selva.
Dois mil anos de domínio do Anticristo em nome de Cristo arderam no delírio das controvérsias, das simulações, das perseguições em nome da piedade divina, das lutas e matanças que ensangüentaram toda a Terra, para saciar a sede e a fome de conquista dos dominadores. Além da crucificação do Cristo foi necessário o suplício dos mártires e a matança sem limites dos inocentes, na defesa da moral cristã revirada no avesso das morais arcaicas. Só então foi possível, graças ao florescimento das gerações renovadoras, o impacto das eclosões mediúnicas e a ressurreição do culto pneumático (do grego: pneuma, espírito), no reconhecimento difícil da faculdade mediúnica, ainda hoje torturada pela brutal incompreensão dos que não conseguiram elevar-se um pouco acima das convenções condicionadoras de atitudes e comportamentos anticristãos. O amor humano voltou à sensualidade desbragada dos cultos pagãos, como advertiu Paulo aos Coríntios.
A Moral Mediúnica, entretanto, não cedeu. As experiências da prática espírita revelaram a situação desesperada em que se encontravam, na ressurreição imediata, não da carne, mas do espírito dos mortos, os que haviam tripudiado sobre os ensinos do Mestre. Kardec, em O Céu e o Inferno, provava a possibilidade de saber-se, neste mundo, o que se passa no outro. Os quadros das aflições umbralinas, dos espíritos que não conseguiram ir além dos umbrais da Terra, permanecendo nas regiões inferiores do mundo espiritual eram realmente infernais, embora não tanto como na imaginação dos teólogos, torturadores criadores de demônios. Os que haviam, por seus méritos, alcançado os planos superiores, não viviam entre anjos em revoadas, mas gozavam de situação realmente feliz. Além disso, as pesquisas kardecianas revelavam, confirmando Paulo, em contradição com os teólogos, que a ressurreição de Jesus não fora no corpo carnal, mas no corpo espiritual, e que os mortos não esperam o Dia do Juízo para ressuscitar, pois, ainda de acordo com Paulo, ressuscitam logo após a morte. Kardec lembrava que os teólogos não haviam conseguido localizar o Purgatório, mas ele o fazia, indicando que o lugar de purgação era a Terra, em nosso sistema solar, e mundos de condições semelhantes às do nosso planeta. em outros sistemas A vaidade humana sentia-se ferida, na tola pretensão de estarmos, como queria o Dr. Pangloss, no melhor dos mundos. Ruíam as pretensões igrejeiras ante essas revelações baseadas em pesquisas sérias, feitas com rigor científico, mas a Igreja investia furiosa contra o Espiritismo, que lhe roubava o direito aos segredos de Deus. Dali por diante, as criaturas de bom-senso não comprariam mais os passaportes eclesiásticos para as mansões celestes. Não obstante, a situação das almas do Purgatório era tão grosseira que elas continuariam a negociar nos guichês sagrados todos os sacramentos supostamente capazes de levá-las ao Céu, como ainda hoje o fazem.
A Moral Mediúnica não se impunha e não se impõe de maneira coercitiva ou ao tilintar das moedas. Abolindo a simonia, mostrava que só existe realmente uma maneira de se conseguir passaporte para o Céu: a prática da caridade cristã humilde, silenciosa e secreta, sem alardes e intenções mercenárias. Os vendilhões do Templo eram novamente expulsos com bois e carneiros sacrificiais, mas dessa vez com o chicote invisível das manifestações mediúnicas. Restabelecia-se o princípio evangélico do dai de graça o que de graça recebestes. Nem um só dos atos mediúnicos poderia ser pago. pois não se vende o que não se possui. Esse é um dos princípios mais exigentes da Moral Mediúnica. O Médium que a viola desrespeita as próprias palavras do Cristo e se faz ladrão perante sua própria consciência. A Moral Mediúnica substitui o sacerdócio remunerado pelo mediunato gratuito. As mãos do Médium devem estar marcadas nobremente pelos calos do trabalho com que se sustenta e limpas de interesses materiais em tudo quanto fizer. pois não lhe cabe o direito de cobrar o que recebeu para a prática do amor ao próximo. O Médium sabe e o confirma experimental-mente, no exercício das suas funções espirituais — na ajuda ao doente e aos desvalidos, na assistência ao moribundo e ao desesperado, no ensino doutrinário e na pregação evangélica e assim por diante — que não pode vender o que não é dele, que não pode extorquir dinheiro do próximo a pretexto de que lhe dar recursos que não dependem dele. Essa medida estabelecida por Kardec na prática espírita tornou-se o princípio básico da ética doutrinária, fundamentada nos Evangelhos. Em conseqüência dela, muitos exageros são cometidos. Certas pessoas acham que um profissional espírita de qualquer ramo está obrigado a fazer tudo de graça no campo doutrinário e até mesmo para os adeptos da doutrina. Um médico, um pedreiro, um advogado, um dentista e assim por diante, devem trabalhar gratuitamente nas instituições espíritas. É uma extensão absurda de principio referente exclusivamente aos dons espirituais. O médium, o conferencista, o doutrinador, todos os que dão assistência espiritual individualmente, em sentido religioso nada podem cobrar. Fora do campo espiritual e religioso não existe nem pode existir o princípio da gratuidade. A finalidade desse princípio é evitar a institucionalização religiosa do Espiritismo em forma de igreja, evitar o comércio religioso, a simonia das igrejas. Porque um pregador pago ou um médium pago expõe-se à tentação de transformar a doutrina em meio de vida. Dessa tentação pode nascer a profissionalização religiosa, que acabaria subordinando a própria doutrina aos interesses financeiros. Os interesses particulares excitam a ambição e anulam a espontaneidade e a sinceridade, abrindo brechas por toda parte para o aviltamento doutrinário. Onde entra o lucro, o interesse pessoal, desaparece a abnegação e com ela a mais alta virtude espírita que é a doação de si mesmo em favor da causa humanitária. Um médium pago, mesmo discretamente, mais hoje, mais amanhã vai entregar-se à fraude, pois se não produzir fenômenos — o que não depende dele — perderá a clientela. Não se trata de um princípio religioso, mas de uma medida ética em defesa da pureza da prática espírita.
Essa medida se justifica não só pelas razões éticas, mas também pela observação do que se passa na prática doutrinária. Uma instituição espírita fundada com dificuldades, onde se destaca o desinteresse e a abnegação de todos, basta crescer um pouco e começar a enriquecer-se para que tudo nela se modifique. O homem sofre a hipnose da moeda, o dinheiro o alucina e o transforma em desonesto. São poucos os que resistem a esse poder do dinheiro, que na verdade não está no dinheiro mas na alma gananciosa e vaidosa. Há casos espantosos de instituições que se enriqueceram e esqueceram as suas próprias finalidades, transformando-se em verdadeiras casas comerciais, onde o interesse financeiro se sobrepõe aos interesses sagrados da doutrina. Os médiuns em evidência são tentados a passar de uma instituição para outra com a promessa de vencimentos disfarçados em benefícios à família ou em pagamento de funções técnicas que não conhecem. Felizmente a maioria dos médiuns têm resistido a essas tentações e triunfado dignamente. Mas os diretores dessas instituições fascinadoras e invigilantes caíram no erro, incidiram no atentado ao formularem suas propostas aviltantes. Se isso acontece em plena vigência do princípio de gratuidade, abandonado o princípio teríamos a venda e compra de passesde médiuns como se fossem jogadores de futebol.
Os que compreendem a doutrina e a amam, e zelam por ela, não podem endossar e nem mesmo tolerar essas irresponsabilidades perigosas.
Os médiuns curadores são os mais expostos à tentação do dinheiro, assediados por laboratórios e até mesmo por hospitais que lhes oferecem empregos generosos em seu quadro de funcionários, para explorar o seu nome e a sua mediunidade, com o sofisma de que ali poderão trabalhar sem perigo e prestar maiores serviços em casos incuráveis. Muitos deles caíram nesses alçapões do mundo, mas a maioria não cedeu. A Moral Mediúnica falou mais alto em suas consciências. Os médiuns de efeitos-físicos e particularmente os de materialização geralmente são tentados pela sua própria ganância ou pela ignorância de pessoas que pretendem exibi-los para converter os incrédulos. Como se o Espiritismo fosse uma questão de crença e de proselitismo, e não um processo de transformação do homem e do mundo. Em tudo isso pontificam a ignorância, a ganância e a vaidade, estigmas da inferioridade espiritual, que merecem a piedade dos espíritas sinceros, mas não a tolerância que leva à cumplicidade.
Não se pode, porém, manter um hospital, uma creche, um orfanato, uma escota, uma Faculdade ou uma Universidade — absolutamente necessários no meio espírita, para a própria realização das finalidades doutrinárias, sem a contratação de profissionais de várias categorias, espíritas ou não, que darão a sua força de trabalho devidamente remunerada. Mesmo nesses casos temos encontrado gestos de abnegação de espíritas que se dedicam à execução de serviços gratuitos, muitas vezes recebendo o salário e devolvendo-o no todo ou em parte aos cofres da instituição como doação. Não estão obrigados a isso, mas o fazem na intenção de melhor colaborar com as instituições, convictos da sua importância e necessidade. Mas esses são casos de consciência, de pura abnegação dos que podem fazê-lo. Mas no campo mediúnico nada disso é permitido. Os médiuns podem ser socorridos em suas necessidades por amigos e companheiros generosos, quando realmente necessário, mas não pode vender os dons mediúnicos nem mesmo a pretexto de fazê-lo em benefício desta ou daquela instituição.
Nas reuniões de passes proíbe-se o toque dos médiuns nos pacientes, a não ser para ajudá-los em casos extremos, para evitar mal-entendidos e suspeitas maliciosas que atentam contra o médium, a instituição e a doutrina. Não é necessário de maneira alguma o toque do médium, nem mesmo a pretexto de transfusão fluídica, como se faz em algumas modalidades do sincretismo religioso afro-brasileiro. As mãos do médium funcionam nos passes como antenas captadoras e emissoras de vibrações dos espíritos, o que pode ser feito até a grandes distâncias. A Moral Mediúnica não é nem pode ser preconceituosa, mas não dispensa medidas de segurança e defesa em meio à malícia do mundo. Os passes individuais são geralmente dispensáveis, mas a maioria das pessoas tem necessidade psicológica da imposição das mãos para se sentirem beneficiadas, mas sempre de maneira discreta, guardando a distância conveniente. Muitos aborrecimentos o médium pode evitar com essa precaução. É claro que não devemos ceder aos preconceitos estúpidos, fundados numa falsa moral, mas o preço de uma despreocupação é às vezes tão alto, não atingindo apenas o médium, que não nos convém pagá-lo. Nas relações com o público, na maioria desconhecedor da doutrina, devemos tomar todas as precauções, até mesmo para não afastarmos do benefício pessoas sistemáticas que não compreendem a grandeza de uma doação fluídica. Restringir-nos à nossa maneira de ser, confiantes em nossa sinceridade, sem levar em conta as condições do próximo, é também uma forma de egoísmo.
Certas instituições tomam medidas extremadas como a divisão de homens e mulheres em grupos separados em seus trabalhos mediúnicos ou de palestras e cursos. Trata-se de resquícios da moral hipócrita de tempos excessivamente místicos, em que os moralistas cristãos faziam como os fariseus acusados por Jesus: coavam um mosquito e engoliam um camelo. Toda forma de extremismo é sempre negativa, denotando insegurança e desconfiança de tudo e de todos. Medidas extremas como essa revelam falta de maturidade dos que as impõem e falta de respeito pelos freqüentadores. Além disso, levam ao ridículo. Devemos lembrar-nos desta expressão feliz de Kardec: O Espiritismo é uma questão de bom-senso. As pessoas que freqüentam uma reunião espírita devem ser consideradas como respeitáveis e responsáveis. No caso do passe a medida é de ordem puramente interna não pública, transmitida particularmente aos médiuns, de maneira que não ofende a dignidade alheia. Quanto à dignidade dos médiuns, também não é afetada no caso do passe, desde que não recebam uma ordem específica pessoal, mas a devida explicação do problema. Existe a desconfiança semeada pelos adversários da doutrina é justo que se tomem medidas de resguardo, no entendimento fraterno entre dirigentes e médiuns. Há pequenas minúcias no trato com o público que não podem ser esquecidas na prática mediúnica.
Autor: J.Herculano Pires
Livro: Mediunidade
Site: Luz do Espiritismo – Grupo Espírita Allan Kardec

sábado, 25 de junho de 2016

A Impessoalidade do Exercício Mediúnico

Quando procuramos um médium, não procuramos por ser Rita, Maria ou José. Buscamos determinadas qualidades que tornam o médium mais apto à tarefa que seapresenta. Buscamos, entre os médiuns da mesa, o perfil mais apropriado.Servimo-nos daquele que melhor se adapta à necessidade do momento.
Nestesentido é que dizemos que as ligações mediúnicas mais saudáveis são impessoais.
Senos ligamos afetivamente aos médiuns com que trabalhamos? Claro! Mas não lhesomos exclusivos, nem ele o é para nós, e não hesitaremos em buscar outromedianeiro mais qualificado para um mister diferente, se esta providência semostrar cabível.
Espíritosque se ligam aos médiuns por motivos pessoais existem, e não são poucos. Hajavista, toda a gama dos obsessores e subjugadores. Também as afinidades estabelecidas em existências anteriores poderão facilitar o contato com estascriaturas. Mas o bom médium não vive de ligações pessoais com almas familiaresou simpáticas. Ele busca, no estudo e autoconhecimento aliados à humildade, apossibilidade de ser mais útil a uma variedade maior de Espíritos e eficientenuma diversidade de situações.
Aliás,se fazemos alguma distinção com relação aos médiuns é no que tange ao desenvolvimentodestas virtudes:
  • o estudo sincero e o empenho real em aprender sobre a mediunidade e as leis espirituais;
  • o conhecimento de si mesmo que diminui a possibilidade de ser enganado por suas próprias fraquezas;
  • a humildade, que evita interferências personalistas do orgulho e da vaidade.
  • Seexiste um médium para preferirmos exclusivamente como instrumento e, não, comoser humano, é este.
    Acostume-se,portanto, o médium a não tomar como pessoais as ligações que se estabelecem nareunião, a não se tornar defensor ou acusador da criatura necessitada que oprocura para fins de reajustamento íntimo, nem se considere agraciado pelachance de ser intermediário de palavras sublimes.
    Aprudência pede que se abstenha de comentários que denunciem preferências ou antipatiaspor esta ou aquela entidade comunicante. O amor abraçará a todos, na medida emque aumentar dentro de nós.
    Entregar-seao serviço mediúnico com bondade e sem acúmulo de expectativas sobre o própriodesempenho e sobre as comunicações recebidas é a melhor maneira de não se versurpreendido, mais tarde, pela fileira dos equívocos de julgamento.
    Quando,na sua tarefa habitual, o médium consegue igualmente se desprender de suasexigências e maneirismos pessoais, quando consegue relevar seu desejo de atendersomente a determinada faixa de Espíritos em benefício da experimentação e dosocorro às criaturas em sofrimento, torna-se facilitador do próprio aprendizadoe desenvolvimento.
    Quando,ao contrário, fecha-se no limite de mimos e idiossincrasias é ele, mais quequalquer outro, quem perde a oportunidade da lição presente na experiência.
    Nosilêncio de sua alma, cada um sabe o que pode ou não fazer com sua faculdadesem prejudicar a saúde física e emocional. Que ninguém se prejudique com opretexto de servir, e recorra aos Espíritos orientadores para esclarecer-se eassegurar-se do que é apropriado a cada momento. Mas também, que ninguém senegue a possibilidade de tentar algo novo, por preconceitos ou receios semmaior justificativa que os próprios preconceitos.
    Queninguém busque os louros da glória entre os homens, porque no ponto mais altodo exercício mediúnico encontram-se a abnegação e o desinteresse.
    Entendera mediunidade como a moeda recebida em confiança na parábola dos talentos;aplicá-la, não exclusivamente segundo nossos gostos, mas segundo asnecessidades da vida; investi-la sem medo, mas com bom senso, e semdistribuição indiscriminada dos seus bens, tudo isto são responsabilidades detodo bom médium.
    Unicamente o discernimento e a humildade conferem parâmetros seguros a este exercício, discernimento e humildade que não podem conviver com o personalismo.
    Autores:  Werneck / Rita Foelker
    Site:  Luz do Espiritismo – Grupo Espirita Allan Kardec

    sexta-feira, 24 de junho de 2016

    A Serviço da Mediunidade

    A seara mediúnica é largo e expressivo campo a trabalhar, exigindo cuidados especiais e acurada dedicação.
    As dificuldades a vencer, desafiadoras, não são poucas, impondo valiosos investimentos da paciência, no exame crítico da sincera análise dos resultados obtidos.
    Abstraindo-se os casos de mistificação consciente e irresponsável, que podem e devem ser enquadrados como desarranjos do comportamento moral, há sempre os desavisos e distonias, os problemas da filtragem psíquica e, principalmente, as delicadas colocações da identidade dos Espíritos.
    Não sendo o médium senão um Espírito encarnado, em processo de conquista de valores morais e intelectivos, as comunicações de que se torna objeto quase sempre estão em correspondência com a sua própria capacidade, tendo-se em vista a questão da sintonia.
    A mediunidade exige esforço, conhecimento, realização, perseverança, a fim de se poderem colher resultados opimos.
    Cresça o médium e mais amplas serão as suas possibilidades de registro, de influenciarão, interessando aos Espíritos Superiores o intercâmbio para o qual se coloca espontaneamente.
    Nenhum programa de violência por parte dos desencarnados devem esperar os candidatos ao exercício da mediunidade, senão quando provocados pela insensatez ou perversidade daqueles com os quais sincroniza.
    Aprimore-se o servidor e mais fáceis ser-lhe-ão as tarefas a executar.
    Afastando-se o fantasma do animismo, que tem mutilado admiráveis servidores da mediunidade, que se sentem atormentados pelo receio da fraude inconsciente, surge a difícil colocação da mediunidade lúcida, passível, sem dúvida, de equívocos.
    A continuidade, no entanto, dos esforços no exercício da faculdade latentes em todas as criaturas consegue facultar uma superação do aparente prejuízo, em decorrência da facilidade com que o médium, conhecendo as leis dos fluidos, identificará se se trata de uma comunicação anímica ou de Entidades Espirituais.
    Muitos gostariam de lograr transmitir dados que identifiquem os comunicantes de modo irrefutável, e assinalam que a lucidez mental perturba-os, impedindo-os de localizar corretamente nomes, datas, detalhes informativos que bem caracterizem as mensagens de que se fazem instrumento.
    Ainda aí, o próprio contínuo exercício da faculdade torna maleável o médium, que logra anular a própria personalidade enquanto assomado pela que lhe interfere psiquicamente…
    Toda esta problemática pode ser amenizada e até superada por meio de uma perfeita sintonia e, paralelamente, através da conquista dos valores íntimos, da concentração, do equilíbrio, da paz.
    A mente em repouso reflete com eficiência as imagens que se lhe projetam.
    Neste capítulo, não se descurem os servidores da mediunidade do exame das comunicações retumbantes, anunciadoras de acontecimentos futuros, recheadas de dados tendentes a uma reformulação dos conceitos vigentes da Ciência e que, para melhor impressionarem, trazem firmas de personalidades célebres, de outras que se santificaram, dos Evangelistas e até mesmo do Mestre Galileu…
    Examinadas sob criteriosa lógica, não resistem essas mensagens ao bisturi do bom senso, em face da trivialidade, da insensatez e até mesmo do ridículo de que se revestem, traduzindo a intenção irresponsável e infeliz dos frívolos desencarnados, que se utilizam da vaidade dos que os aceitam, a fim de confundirem e amesquinharem com intentos perturbadores.
    Não tem maior importância o nome que subscreve uma página mediúnica e sim o conteúdo de que a mesma é portadora.
    A mensagem sadia deve sempre colimar o progresso moral da criatura humna, conclamando de forma simples e clara ao auto-aprimoramento e à conquista dos bens espirituais.
    Em face da necessidade, às vezes, de uma averiguação de identidade, é imprescindível, quando se trata de personalidades conhecidas, o cotejo do estila, da forma, sem nunca perder-se de vista o conteúdo que deve primar pela qualidade e intencionalidade positiva, objetivando esclarecer, amparar, promover o homem.
    É certo que a morte deveste as criaturas dos atavios com que se apresentavam.
    Muitos conceitos, hábitos e características que constituíam bens e valores perdem o significado, não mais importando-se os Espíritos por preservá-los, conforme o faziam anteriormente.
    Desse modo, em retornando do Mundo Espiritual, alteram-se os caracteres e o modo de se expressarem, seja na literatura, na música, na pintura, na poesia, o que constitui, de certo modo, impedimento para os críticos rigorosos aceitarem-nos.
    Já não têm os Espíritos esse tipo de preocupação, esse interesse pela glória terrena…
    Mesmo no corpo físico, o fenômeno é equivalente.
    Uma pessoa que se transfere de um para outro centro cultural, onde os valores são diversos e outros os hábitos, após uma temporada de largos anos assimilando os novos condicionamentos, ao volver ao local de origem, apresentar-se-á diferente de quando partiu. Só uma convivência mais próxima com alguém que o conheceu fá-lo-á desvelado.
    A nossa questão vincula-se ao cuidado, ao pudor que deve assinalar o médium que, de momento, seja atirado ao redemoinho das comunicações de efeito retumbante, que o bom senso espírito repele, impedindo-se a vaidade – ponte pênsil de acesso à obsessão por fascinação -, que tem levado à queda, ao desequilíbrio e à alucinação os que transitam por esse espaço livre e perigoso.
    A humildade real, sem os disparates do fingimento, e a prece ungida de ardor, no trabalho da caridade ao próximo, mediante atos sacrificais e abnegação, constituem, por um lado, a terapêutica curadora e, por outro, a preventiva, a fim de que as futuras florações do bem venham a produzir em abundância, tornando a seara da mediunidade um campo de paz e de esperança com trabalho libertador para todos.

    Espírito: Vianna de Carvalho
    Médium: Divaldo P. Franco – Enfoques Espíritas
    Site: Luz do Espiritismo – Grupo Espirita Allan Kardec