Allan Kardec in O LIVRO DOS ESPÍRITOS, livro terceiro, cap. XII, q. 918 e
O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO, cap. XVII. itens 3 e 4
O homem de bem
O
verdadeiro homem de bem é o que cumpre a lei de justiça, de amor e de
caridade, na sua maior pureza. Se ele interroga a consciência sobre seus
próprios atos, a si mesmo perguntará se violou essa lei, se não
praticou o mal, se fez todo o bem que podia, se desprezou
voluntariamente alguma ocasião de ser útil, se ninguém tem qualquer
queixa dele; enfim, se fez a outrem tudo o que desejara lhe fizessem.
Deposita
fé em Deus, na Sua bondade, na Sua justiça e na Sua sabedoria. Sabe que
sem a Sua permissão nada acontece e se Lhe submete à vontade em todas
as coisas.
Tem fé no futuro, razão por que coloca os bens espirituais acima dos bens temporais.
Sabe que todas as vicissitudes da vida, todas as dores, todas as decepções são provas ou expiações e as aceita sem murmurar.
Possuído
do sentimento de caridade e de amor ao próximo, faz o bem pelo bem, sem
esperar paga alguma; retribui o mal com o bem, toma a defesa do fraco
contra o forte, e sacrifica sempre seus interesses à justiça.
Encontra
satisfação nos benefícios que espalha, nos serviços que presta, no
fazer ditosos os outros, nas lágrimas que enxuga, nas consolações que
prodigaliza aos aflitos. Seu primeiro impulso é para pensar nos outros,
antes de pensar em si, é para cuidar dos interesses dos outros antes do
seu próprio interesse. O egoísta, ao contrário, calcula os proventos e
as perdas decorrentes de toda ação generosa.
O
homem de bem é bom, humano e benevolente para com todos, sem distinção
de raças, nem de crenças, porque em todos os homens vê irmãos seus.
Respeita nos outros todas as convicções sinceras e não lança anátema aos que como ele não pensam.
Em
todas as circunstâncias, toma por guia a caridade, tendo como certo que
aquele que prejudica a outrem com palavras malévolas, que fere com o
seu orgulho e o seu desprezo a suscetibilidade de alguém, que não recua à
ideia de causar um sofrimento, uma contrariedade, ainda que ligeira,
quando a pode evitar, falta ao dever de amar o próximo e não merece a
demência do Senhor.
Não
alimenta ódio, nem rancor, nem desejo de vingança; a exemplo de Jesus,
perdoa e esquece as ofensas e só dos benefícios se lembra, por saber que
perdoado lhe será conforme houver perdoado.
É indulgente para as fraquezas alheias, porque sabe que também necessita de indulgência e tem presente esta sentença do Cristo: "Atire-lhe a primeira pedra aquele que se achar sem pecado."
Nunca
se compraz em rebuscar os defeitos alheios, nem, ainda, em
evidenciá-los. Se a isso se vê obrigado, procura sempre o bem que possa
atenuar o mal...
Estuda
suas próprias imperfeições e trabalha incessantemente em combatê-las.
Todos os esforços emprega para poder dizer, no dia seguinte, que alguma
coisa traz em si de melhor do que na véspera.
Não
procura dar valor ao seu espírito, nem aos seus talentos, a expensas de
outrem; aproveita, ao revés, todas as ocasiões para fazer ressaltar o
que seja proveitoso aos outros.
Não se envaidece da sua riqueza, nem de suas vantagens pessoais, por saber que tudo o que lhe foi dado pode ser-lhe tirado.
Usa,
mas não abusa dos bens que lhe são concedidos, porque sabe que é um
depósito de que terá de prestar contas e que o mais prejudicial emprego
que lhe pode dar é o de aplicá-lo à satisfação de suas paixões.
Se
a ordem social colocou sob o seu mando outros homens, trata-os com
bondade e benevolência, porque são seus iguais perante Deus; usa da sua
autoridade para lhes levantar o moral e não para os esmagar com o seu
orgulho. Evita tudo quanto lhes possa tornar mais penosa a posição
subalterna em que se encontram.
O
subordinado, de sua parte, compreende os deveres da posição que ocupa e
se empenha em cumpri-los conscienciosamente. (Cap. XVII, nº 9.)
Finalmente,
o homem de bem respeita todos os direitos que aos seus semelhantes dão
as leis da Natureza, como quer que sejam respeitados os seus.
Não
ficam assim enumeradas todas as qualidades que distinguem o homem de
bem; mas, aquele que se esforce por possuir as que acabamos de
mencionar, no caminho se acha que a todas as demais conduz.
Os bons espíritas
Bem
compreendido, mas sobretudo bem sentido, o Espiritismo conduz
forçosamente aos resultados acima, que caracterizam o verdadeiro
espírita, como o cristão verdadeiro, pois um e outro são a mesma coisa. O
Espiritismo não institui nenhuma nova moral; apenas facilita aos homens
a inteligência e a prática da do Cristo, facultando fé inabalável e
esclarecida aos que duvidam ou vacilam.
Muitos,
entretanto, dos que acreditam nos fatos das manifestações não lhes
apreendem as consequências, nem o alcance moral, ou, se os apreendem,
não os aplicam a si mesmos. A que atribuir isso? A alguma falta de
clareza da Doutrina? Não, pois que ela não contém alegorias nem figuras
que possam dar lugar a falsas interpretações. A clareza e da sua
essência mesma e é donde lhe vem toda a força, porque a faz ir direito à
inteligência. Nada tem de misteriosa e seus iniciados não se acham de
posse de qualquer segredo, oculto ao vulgo.
Será
então necessária, para compreendê-la, uma inteligência fora do comum?
Não, tanto que há homens de notória capacidade que não a compreendem, ao
passo que inteligências vulgares, moços mesmo, apenas saídos da
adolescência, lhes apreendem, com admirável precisão, os mais delicados
matizes. Provém isso de que a parte por assim dizer material da ciência
somente requer olhos que observem, enquanto a parte essencial exige um
certo grau de sensibilidade, a que se pode chamar maturidade do senso
moral, maturidade que independe da idade e do grau de instrução, porque é
peculiar ao desenvolvimento, em sentido especial, do Espírito encamado.
Nalguns,
ainda muito tenazes são os laços da matéria para permitirem que o
Espírito se desprenda das coisas da Terra; a névoa que os envolve
tira-lhes a visão do infinito, donde resulta não romperem facilmente com
os seus pendores nem com seus hábitos, não percebendo haja qualquer
coisa melhor do que aquilo de que são dotados. Têm a crença nos
Espíritos como um simples fato, mas que nada ou bem pouco lhes modifica
as tendências instintivas. Numa palavra: não divisam mais do que um raio
de luz, insuficiente a guiá-los e a lhes facultar uma vigorosa
aspiração, capaz de lhes sobrepujar as inclinações. Atêm-se mais aos
fenômenos do que a moral, que se lhes afigura cediça e monótona. Pedem
aos Espíritos que incessantemente os iniciem em novos mistérios, sem
procurar saber se já se tornaram dignos de penetrar Os arcanos do
Criador. Esses são os espíritas imperfeitos, alguns dos quais ficam a
meio caminho ou se afastam de seus irmãos em crença, porque recuam ante a
obrigação de se reformarem, ou então guardam as suas simpatias para os
que lhes compartilham das fraquezas ou das prevenções. Contudo, a
aceitação do princípio da doutrina é um primeiro passo que lhes tornará
mais fácil o segundo, noutra existência.
Aquele
que pode ser, com razão, qualificado de espírita verdadeiro e sincero,
se acha em grau superior de adiantamento moral. O Espírito, que nele
domina de modo mais completo a matéria, dá-lhe uma percepção mais clara
do futuro; os princípios da Doutrina lhe fazem vibrar fibras que nos
outros se conservam inertes. Em suma: é tocado no coração, pelo que
inabalável se lhe torna a fé. Um é qual músico que alguns acordes bastam
para comover, ao passo que outro apenas ouve sons. Reconhece-se o
verdadeiro espírita pela sua transformação moral e pelos esforços que
emprega para domar suas inclinações más. Enquanto um se contenta com o
seu horizonte limitado, outro, que apreende alguma coisa de melhor, se
esforça por desligar-se dele e sempre o consegue, se tem firme a
vontade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário