sábado, 6 de junho de 2015

Pelos Caminhos da Educação

Liberdade, Escravização e Escravidão
O sonho humano de liberdade é exteriorização dessa outorga de Deus por sobre a criatura e que implica, necessariamente, em escolha, nas instâncias do indivíduo, do grupo, da sociedade. A conclusão lógico-filosófica a que chegaram os filósofos, ao longo dos tempos, a propósito do escopo da liberdade, é que ninguém goza de liberdade absoluta, posto que, na interdependência dos seres, um constitui-se limite para o outro. No entanto, a História e o cotidiano mostram que o homem, a despeito de seu anseio, paradoxalmente pode usar – e tem usado – seu livre-arbítrio para cercear a vivência da liberdade em si mesmo e pelo outro. Usando de sua liberdade, “o homem pode tornar-se escravo de si mesmo. Exerce o autocerceamento em decorrência das monoideias, idéias fixas em coisas materiais ou ao mundo material relacionadas, vive os mitos do poder, do prazer e da permanência, todos sabidamente efêmeros no plano filosófico, racional, mas não necessariamente no plano psicológico, emocional. Torna-se escravo de postulados que lhe proíbem a expansão da alma, do psiquismo, pela idéia, pela razão: no sectarismo, o homem encarcera a liberdade de consciência, revela e até aumenta seu grau de clausura, fechando-se à realidade de si mesmo, do outro, do mundo e de Deus”.
É claro que a vida em sociedade impõe regras para que haja ordem nas relações e instituições. Chegamos à questão multifacética da auto e hetero-disciplina, com vertentes para a rigidez, o fanatismo, para a coerção e escravização-processo/escravidão-condição, sendo esta “contrária à lei de Deus”, “um abuso da força (…) que desaparece com o progresso (…).”
Que é o processo de Educação do Espírito senão o de transição, pela via da consciência, da heteronomia para a autonomia? Ainda assim, esta condição, quando atingida, não representa liberdade total. No cotidiano, heteronomia é a condição em que o indivíduo é constrangido a obedecer regras e leis criadas pelo (s) outro (s), a exemplo da Constituição, do Código de Trânsito, o Imposto de Renda, ou, no plano das relações pessoais, entre pais-filhos e cônjuge-cônjuge, criança-adulto, funcionário-chefe, crente-religião etc. Pode configurar-se quando um domina emocional, econômica e/ou intelectualmente o outro, como é o caso, por exemplo, dos métodos “didáticos” de memorização, de reprodução exata do que o professor disse ao ministrar a aula, porque só isso vai ser considerado nas avaliações de aprendizagem, para obtenção de grau ou nota.
A liberdade é outorga divina, mas o homem, ao usá-la, pode facultar a si mesmo e ao outro um processo de escravização a caminhos que o “prendem” a uma idéia fixa, ou a uma situação, ou relação, ou causa, mesmo que justa, posto que alguns indivíduos fanatizam-se por ela. É também por essa mesma faculdade que o homem, em movimento de auto-corrigenda, promove o processo de liberdade de si mesmo e do outro.
As regras e costumes do passado pesam sobre todos nós. No capítulo da subjugação do outro, por exemplo, os procedimentos e atos da Inquisição representam nota discordante da liberdade de expressão, como os prisioneiros políticos a da liberdade de pensar. E nesse mesmo triste capítulo, o escravismo, fundado na idéia da formação de unidades produtivas com base no trabalho cativo, através da escravidão escreveu dolorosas páginas desde os tempos das sociedades greco-romanas, em várias partes do mundo. No Brasil, é sempre recomendável não nos esqueçamos, sob pena de incorremos nós em injustiça histórica e falta de caridade moral, de que nossos irmãos índios, os donos da terra brasiliensis, foram os primeiros a sofrer a rudeza da condição escrava, seguido pelos negros, em épocas em que as classes dominantes em toda parte não questionavam a legitimidade do cativeiro índio ou negro, este solicitado pelos próprios Espíritos, do qual foram libertados pela pena e pelo coração da Princesa Isabel.
Em Brasil coração do mundo pátria do Evangelho, pela psicografia de Francisco Cândido Xavier, o Espírito Humberto de Campos revela as “sagradas determinações do Divino Mestre” ao fazer trazer “um náufrago e inocente para a base da sociedade fraterna do porvir”, assim constituída, já sob as sonoridades sublimes dos “ecos acariciadores do Sermão da Montanha”: “Primeiramente, surgiram os índios, que eram os simples de coração; em segundo lugar, chegavam os sedentos de justiça divina e, mais tarde, viriam os escravos, com a expressão dos humildes e dos aflitos, para a formação da alma coletiva de um povo bem-aventurado por sua mansidão e fraternidade”.
Autor (a): Nadja do Couto Valle
Revista Cultura Espírita – nº 14 – página: 05 – maio / 2010
ICEB (Instituto de Cultura Espírita do Brasil / Rio de Janeiro)

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