quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Necessidade Da Culpa

A culpa sempre se esculpe no inconsciente como uma necessidade de punição, através de cujo mecanismo o ego se liberta do delito.
Originada na conceituação ancestral de pecado — herança atávica do pecado original, que seria a desobediência de Adão e Eva, os arquétipos ancestrais do ser humano, a respeito da Árvore da sabedoria do Bem e do Mal —tem sido, através do processo da evolução, um agente cruel punitivo, que vem desequilibrando o seu mecanismo psicológico.
Desse modo, a consciência de culpa torna-se tortura lúcida ou não para o emocional, gerando tormentos que poderiam ser evitados se outros processos houvessem sido elaborados para facultar a reparação do erro.
Por isso mesmo, ao invés de pecado ou culpa, surge o conceito de responsabilidade, mediante a qual a colheita se deriva da semeadura, sem qualquer expressão castradora do discernimento nem fatalista do sofrimento.
Não obstante a anuência com esse contributo psicoterapêutico valioso, a culpa lúcida, bem absorvida, transforma-se em elemento positivo no que tange ao acontecimento malsucedido.
A simplificação psicológica do ato infeliz, diminuindo-lhe a gravidade e não lhe concedendo o valor que merece — nem mais nem menos do seu conteúdo legítimo — pode conduzir à irresponsabilidade, à perda de discernimento dos significados éticos para o comportamento, gerando insensibilidade, desculpismo, falta de esforço para a aquisição do equilíbrio saudável.
Existe a culpa tormentosa, aquela que se mascara e adormece no inconsciente profundo, trabalhando transtornos de consciência, ante a consideração do ato ignominioso não digerido. No entanto, pode-se considerá-la numa outra expressão, que seria uma avaliação oportuna sobre o acontecimento, tornando-se necessidade reparadora, que propele ao aloperdão, como ao autoperdão.
Essa conscientização do gravame equipa os instrumentos morais da personalidade, no Eu superior, para mantê-lo vigilante, precatando-o de futuras flutuações comportamentais e deslizes ético-morais. Por outro lado, desperta a consciência para estar atenta ante as ocorrências nos momentos infelizes, isto é, naqueles, nos quais, o cansaço, o estresse, a saturação, o mal-estar, a irritação estejam instalados no organismo. Esse é o momento perigoso, a hora errada para tomar decisões, assumir responsabilidades mais graves. O seu significado terapêutico propõe limites geradores de sensibilidade para perceber, orientar e viver a conduta edificante.
Poderemos encontrar esse tipo de culpa não perturbadora na primeira infância, quando medra a faculdade de discernir nos seus primórdios, favorecendo a criança com a noção do que deve em relação àquilo que não convém ser realizado, mais ou menos a partir dos três anos.
Se o indivíduo não possui interiormente, nele esculpido, um código moral para o comportamento, vagueia entre a irresponsabilidade, as psicopatias pessoais e as sociopatias no grupo no qual se encontra.
A culpa terapêutica evita que o paciente se lhe agarre transformando-a em necessidade de reparação do delito, assim derrapando em situação patológica. Trata-se apenas de uma plena conscientização de conduta, com vistas à vigilância emocional e racional para os futuros cometimentos.
Identificada, surge o imperativo do autoperdão, através do qual a racionalização do ato abre campo para o entendimento do fato menos feliz, sem punição, nem justificação doentia, mas, simplesmente, digestão psicológica do mesmo.
Após o autoperdão, surgem os valores da reabilitação, que facultam o enfrentamento das consequências desencadeadas pelo ato praticado.
Necessário seja entendido que o autoperdão, de forma alguma anula a responsabilidade do feito perturbador. Antes faculta avaliação equilibrada da sua dimensão e dos recursos que podem e devem ser movimentados para minimizar-lhe ou anular-lhe as consequências.
Considerada a ação sob a óptica da culpa saudável, não será factível de introjetá-la, evitando que se transforme em algoz interior, que ressurgirá quando menos seja esperado.
Ademais, esse trabalho de identificação da culpa contribuirá para a compreensão da própria fragilidade do ego, dos fatores que o propelem as condutas doentias, assim como à lucidez de como pode autoamar-se e amar às demais pessoas e expressões vivas da Natureza.
Quando se foge a esse compromisso de avaliação do erro, estagiando-se no patamar transitório da culpa terapêutica, o inconsciente elabora instrumentos punitivos que estabelecem os meios cruéis para a regularização, a recomposição do quadro alterado pelos danos que lhe foram impostos.
Assim trabalhada, a culpa não se converte em ressentimento contra a vítima que foi ferida, nem se traveste de necessidade de serem exteriorizadas a raiva e a animosidade contra as demais pessoas.
Aqueles que se não conscientizam do erro e preferem ignorá-lo, soterram-no no inconsciente, que o devolve de maneira inamistosa, irônica, quase perversa contra tudo e contra todos.
O ato de perdoar não leva, necessariamente, à ideia de anuência com aquilo que fere o estatuto legal e o código moral da vida, mas proporciona a compreensão exata da dimensão do gravame e dos comportamentos a serem adotados para que ele desapareça, devolvendo à vida a harmonia que foi perturbada com aquela atitude.
É inevitável o arrependimento que a culpa proporciona, mas também faculta o sofrimento expiatório em relação ao engano, fase inicial do processo de reparação. Não será necessário que se prolongue por um largo período esse fenômeno emocional, a fim de que não se transforme em masoquismo desnecessário e perturbador, gerando autocompaixão, autopunição.
As fronteiras entre uma culpa lúcida e aqueloutra punitiva são muito sutis, e quando não recebem uma análise honesta, confundem-se em um tumulto entre o desejo de ser livre e de ficar aprisionado até a extinção do mal praticado.
Tem ela o objetivo de proporcionar o exercício da honestidade para com o Si, evitando autojustificação, transferência de responsabilidade, indiferença diante do acontecimento.
O Eu superior é o fiel para delimitar as linhas de comportamento entre uma e outra conduta, por ter um caráter universalista, que trabalha pela harmonia geral.

terça-feira, 30 de agosto de 2016

DROGADIÇÃO


Texto de Joanna de Angelis (por Divaldo Franco) retirado do livro “Conflitos Existenciais”.

Fatores Causais da Drogadição

A drogadição constitui, na atualidade, um dos mais graves problemas de saúde mental e orgânica, em face das substâncias tóxicas que exercem sobre o sistema nervoso um predomínio perturbador.

Neste capítulo, incluímos o alcoolismo e todas as suas lamentáveis consequências pessoais, familiares e sociais, arrastando milhões de vítimas aos abismos da loucura, do crime e do suicídio perverso...

Os primeiros prejuízos orgânicos decorrem da perturbação produzida na corticalidade do sistema nervoso, que se encarrega do controle, em face da inibição que proporciona, dos centros nervosos inferiores, logo afetando as fibras do feixe frontal talâmico, diminuindo as inibições e produzindo manifestações, por exibição, de emoções antes freadas e que se apresentam excitadas e dominantes.

Posteriormente alcança o cerebelo, produzindo desgovernação dos movimentos, para logo seguir gerando a paralisia do nervo vagal, que responde pelo equilíbrio existente entre o ritmo cardíaco e o respiratório, tornando-se, em geral, o responsável pela morte do viciado.

Na psicogênese da drogadição encontra-se o Espírito aturdido, inseguro, às vezes revoltado, que traz do passado uma alta carta de frustrações e de rebeldia.

Na fase pré-tóxica, pode-se identificar o dependente como uma personalidade psicopática evoluindo para o processo esquizofrênico.

Igualmente se tem constatado nos oligofrênicos uma certa disposição para o uso de substâncias tóxicas, ou mesmo entre os deficientes mentais, por uma necessidade de afirmação da personalidade, em face da rejeição experimentada ou de alguns preconceitos que o consideram incapaz de realizações mais significativas. Dessa forma, anulando o senso de equilíbrio, esses indivíduos encontram nas drogas um estimulante para alcançar níveis superiores de comunicação e de realização, mesmo que de maneira arbitrária.

Assim, existem níveis diferentes de pessoas que podem tombar nas malhas da drogadição:

a) aquelas que se apresentam atemorizadas, receando a vida que lhes parece sempre injusta e perversa, destituídas de tolerância em relação às próprias frustrações;
b) aqueloutras que podem ser consideradas dependentes, isto é, para quem a existência deve ser sempre agradável e compensadora, buscando, na droga química, seja qual for, uma fuga da realidade que, em face da sua injunção aflitiva, deve ser negada ou apagada a qualquer preço...

O primeiro grupo encontra no uso da droga a segurança que falta no estado de lucidez, embora reconheça que é fácil duração, mantendo a expectativa de renovação de outras doses até o desespero que não tarda.  O segundo, vitimado pela ansiedade, refugia-se no tóxico, evitando o trânsito pelas situações desafiadoras para as quais acredita-se incapaz de enfrentamento.

Porque o entorpecente minora as tensões inibitórias, facilitando a irrupção de condutas recusadas pelo ego, sejam edificantes ou delituosas, o paciente recorre-lhe ao uso, em forma de refúgio, que sempre se transforma em terrível cárcere de agonia incessante.

Sem dúvida, os conflitos do lar contribuem expressivamente para a fuga na direção das drogas. A ausência de diálogos entre os genitores e os filhos, as agressões domésticas, as conversações doentias e a falta de carinho, no que diz respeito à educação doméstica, expulsa o adolescente – muitas vezes a criança – do convívio da família para os traficantes impiedosos, que os adotam, extorquindo-lhes dinheiro e matando-lhes a esperança de uma vida saudável.

Os conflitos internos que aturdem o jovem ou o adulto, que sente insegurança na realização de alguns cometimentos, respondem pela procura de determinadas drogas estimulantes que lhes proporcionam segurança na primeira fase da intoxicação, em razão do estímulo cortical que proporciona certa vivacidade intelectual, respondendo pela euforia e audácia nos gestos. É comum o acontecimento em determinados indivíduos que exercem profissões liberais e são convocados amiúde a ações desafiadoras que temem não poder executá-las com segurança e que o fazem sob a injunção do álcool, de diversas drogas, tais: a morfina, a cocaína, o crack ou outra qualquer...

Não poucos viciados renitentes são vítimas do mesmo hábito que mantiveram em existência anterior, na qual mergulharam em abismo profundo e retornaram com as marcas da dependência que os consome, avançando para expiações muito graves no futuro.

Sob outro aspecto, as vinculações com personalidades psicopatas desencarnadas ou inimigos pessoas de outras experiências carnais respondem pela sua indução à dependência viciosa, na qual também se comprazem em mecanismos de vampirização cruel, em verdadeira interdependência espiritual.

Sem a menor dúvida, é o Espírito enfermo, aquele que mergulha no poço asfixiante da drogadição, arrastando os efeitos da conduta reencarnacionista e dos compromissos alienantes da atualidade na qual se encontra.

Dependência Química

Iniciado o uso de qualquer substância química tóxica, após a euforia mentirosa e a queda na angústia pela falta do estímulo artificial, muitas vezes o paciente experimenta mal-estar compreensível.

Os relacionamentos sedutores e os grupos de convivência doentia encarregam-se de proporcionar novos estímulos e, ao repetir a experiência inicia-se a torpe dependência que leva aos desastres mais imprevisíveis, tanto em relação ao desgaste orgânico, como à degenerescência mental e emocional, e também aos imprevisíveis desvios para o crime: furto, roubo, agressão, homicídio, suicídio...

Porque reconhece o comportamento criticável de que é portador, o viciado em tóxicos torna-se desconfiado, dissimulador, agressivo, mentiroso, avançando no rumo de interpretações delirantes que, às vezes, se convertem em transtornos paranóides.

Invariavelmente o viciado nega o uso de drogas com tanta segurança que engana mesmo aqueles que são conhecedores da problemática.

De início, uma pequena dose é suficiente para gerar estímulos agradáveis em alguns pacientes, enquanto outros são empurrados para os porões do inconsciente, sendo vítimas de terríveis alucinações que os desvairam.

A falta de contato contínuo dos genitores com os filhos, não lhes percebendo as primeiras alterações de conduta quando ocorre a iniciação, permite que os mesmos se entreguem ao vício com assiduidade, criando dependência grave que, ao ser percebida, já exige terapia cuidadosa e prolongada.

Nesse caso, o alcoolismo instala-se, em razão do uso da substância etílica fazer parte do jogo social, dos relacionamentos que primam pela futilidade e por falta de profundidade, permanecendo na superfície das aparências, que proporcionam as libações contínuas de cervejas, vinhos e outros sofisticados produtos, como forma de esconder o desinteresse que sentem umas criaturas por outras.

Perigoso, pela facilidade com que são encontradas as bebidas alcoólicas, esse vício tornou-se um grave problema social e de saúde, em razão da sua difusão nas sociedades distintas, como degradadas, levando a pouco e pouco, o indivíduo a uma situação nociva ao próprio meio no qual transita.

Lares são vergastados pela sevícia dessa dependência, crimes horrendos são praticados pelos seus usuários, agressões vergonhosas e lamentáveis sucedem-se, umas às outras, em voragem alucinante, ceifando muitos milhões de vidas que poderiam ser dignificadas pelo trabalho e pela abstinência do seu enfermiço uso.

Em razão das quantidades ingeridas, desde cedo, podem expressar quadros psicopáticos, que caracterizam as resistências emocionais e mentais dos indivíduos. Alguns há, que são capazes de ingerir volumosa quota de substância alcoólica sem apresentar, de imediato, efeitos danosos. Outros, no entanto, mesmo usando pequenas quantidades, logo aparecem os acidentes psíquicos, uns mais devastadores do que outros, de que não se recorda o enfermo quando recupera a lucidez...

Os dipsômanos, no entanto, são levados de forma irresistível ao uso dessas substâncias, em face da sua ansiedade, embora conscientes da enfermidade que os consome...

Além das heranças genéticas, os traumatismos cranianos e as encefalopatias sutis, na infância, também respondem pela tendência ao alcoolismo.

Podemos introduzir, igualmente, na psicogênese do alcoolismo, as obsessões, como geradoras do vício, qual ocorre, conforme referido, em outras formas de drogadição.

Os efeitos são terríveis na glândula hepática, nos rins, em todo o aparelho digestivo, com os graves comprometimentos emocionais e mentais.

Nas diversas dependências de drogas químicas, após largo período de uso, podem-se registrar alterações do centro da palavra, com dificuldade de silabação, arrastamento da pronúncia, incapacidade de expressar-se com símbolos correspondentes à linguagem em que se comunica o paciente.

A repressão policial e a falta de educação moral, a ausência de esclarecimento correto em torno dos danos produzidos pelas drogas químicas tóxicas, as dificuldades socioeconômicas, os conflitos íntimos, os estímulos proporcionados pelas belas e bem trabalhadas propagandas apresentadas pela mídia, respondem pelo agravamento da epidemia da drogadição que assola a sociedade contemporânea.

O uso abusivo das drogas, em face da dificuldade ou indiferença das demais criaturas para cerceá-lo pelo esclarecimento, vai-se tornando tão natural e quase chique nas denominadas rodas de alto padrão econômico, que ameaça o equilíbrio das criaturas individualmente e da sociedade em geral.

A princípio, a toxicomania produz impacto perturbador, mas, à medida que se avoluma, uma falsa compreensão e tolerância geral finge ser uma forma de conduta da época, como uma válvula para escapar-se à ansiedade, ao estresse, às pressões vigentes, lamentavelmente conduzindo para a loucura, a destruição e a morte...

Terapia de Urgência

O problema desafiador deve ser enfrentado com coragem e altivez. Equivale dizer: com clareza e conhecimento de suas causas e efeitos desagregadores.

Quanto mais escamotear-se o drama da drogadição e fingir-se que não é tão grave quanto realmente se apresenta, somente tornará a questão mais difícil de solução e, portanto, mais perversa.

A educação, sem qualquer dúvida, desde a infância, é o recurso terapêutico preventivo mais valioso, porque é mais seguro evitar a dependência do que sair-se do seu cerco escuso.

Diálogos francos e naturais com as crianças e os jovens devem fazer parte das conversações familiares, das disciplinas transversais nas escolas, antes que os dependentes que nelas se encontram, comecem a iniciação dessas vítimas inermes, ingênuas e inseguras.

Estabelecida a dependência, tendo-se em vista a sua gravidade, o internamento hospitalar para desintoxicação torna-se indispensável. Mesmo porque, a falta do produto leva a desesperos, às vezes, incontroláveis, em cujo período o alucinado comete hediondos crimes, vitimado pelas alucinações que lhe tomam conta das paisagens mentais.

Quando o paciente encontra-se internado sob cuidados médicos especiais, a orientação psiquiátrica saberá ministrar a pequena dose de manutenção, sob controle, diminuindo-a progressivamente, enquanto a psicoterapia e o tratamento com substâncias específicas se encarregarão de reequilibrar o organismo em descompasso gerado pelo uso danoso e arbitrário.

A praxiterapia, a dançaterapia e outros recursos terapêuticos equivalentes fazem-se necessários, a fim de substituírem os estímulos falsos e tóxicos que as drogas produziram no organismo, danificando-lhe a tecelagem delicada.

Como fator primordial, o interesse do paciente na própria recuperação torna-se indispensável, porquanto, somente com a sua vontade bem direcionada, poderá superar os momentos difíceis que surgem, confiando nos resultados futuros.

As leituras edificantes, os exercícios físicos bem programados, não geradores de exaustão nem de ansiedade produzem resultados excelentes, contribuindo para a restauração da saúde.

Jesus, o psicoterapeuta incomum, asseverou: Tudo é possível aquele que crê (Marcos: 9-23).

Quando o paciente resolve-se por libertar-se da problemática afligente, crendo no seu restabelecimento, dá um avançado passo na direção da cura, sendo o restante, o trabalho desafiador necessário para o êxito do processo.

Em razão disso, não poucas vezes as forças morais parecem faltar, em face dos transtornos físicos e emocionais, tornando-se necessário que o paciente procure o refúgio da oração, por cuja conduta experimentará a renovação das energias e o encorajamento indispensável para continuar no seu processo de restabelecimento. Por outro lado, os Espíritos amigos acercar-se-lhe-ão, auxiliando-o com a inspiração superior e as energias refazentes de que necessita, a fim de que ocorra a libertação do fosso em que se atirou. 

segunda-feira, 29 de agosto de 2016

ALCOOLISMO

Ao lado, pintura de Jan Hermansz Bijlert "Jovem com Copo de Vinho", Holanda, séc. XVII.

A presença do álcool em festividades e rituais religiosos data da pré-história da humanidade, de modo que podemos considerar o problema do alcoolismo como ligado intimamente à reencarnação. O alcoolista em potencial, alcoolista se torna ao beber, pois reacende as sensações já consolidadas, ligadas ao prazer ilusório do entorpecimento, muitas vezes como uma fuga dos conflitos emocionais subjacentes. Enfermidade da alma que é, necessita de tratamento médico, psicológico e espiritual, de modo que a cura pode ser alcançada através da força de vontade aliada à reforma moral do indivíduo. Os grupos de mútua ajuda são sempre recomendados neste sentido.


Segue abaixo um texto da Joanna de Angelis, publicado no livro "Conflitos Existenciais" (psicografado por Divaldo Franco).


Alcoolismo e Obsessão

O alcoolismo é grave problema de natureza médica, psicológica e psiquiátrica que merece assistência urgente, como também se apresenta como terrível dano social, em face dos prejuízos orgânicos, emocionais e mentais que opera no indivíduo e no grupo social ao qual pertence.

O alcoolismo envolve crianças mal-orientadas, jovens em desalinho de conduta, adultos e idosos instáveis, gerando altos índices de intoxicação aguda e subaguda em todos, como consequência da facilidade com que se pode conseguir a substância alcoólica que faz parte do status da sociedade contemporânea, como de alguma forma ocorreu no passado.

Apresentam-se dois tipos de bebedores: os de ocasião, que se permitem a ingestão etílica em circunstâncias especiais e os habituais, aqueles que já se encontram em dependência alcoólica.

É mais perigosa, naturalmente, a feição crônica, com boa dose de suporte do organismo que se desequilibra em delírios, quando por ocasião de breve abstinência ou mesmo por pouco de excesso, em razão da progressiva degenerescência dos centros nervosos.

Invariavelmente, a ansiedade desempenha um papel preponderante no uso do álcool, por causa da ilusão de que a sua ingestão acalma, produz alegria, o que não corresponde à verdade. Em muitas personalidades psicopatas, o álcool produz rápidas alucinações ou depressão, levando, na primeira hipótese, à prática de ações criminosas, alucinadas, que desaparecem da lembrança quando volve a consciência.

Noutras vezes, a necessidade irresistível de ingerir o álcool, oferecendo o prazer mórbido do copo cheio, caracteriza o dipsômano ansioso e consciente da sua enfermidade. Esse tipo de enfermo pode manter relativa abstinência e períodos de grande ingestão alcoólica, em verdadeiro ciclo vicioso de que não se consegue libertar, definindo o rumo do abandono do vício.

Ao lado desse, existe o hipômano, que se apresenta com pequenas e constantes intoxicações, podendo demorar meses sem beber qualquer quantidade de substância alcoólica, quando se encontra na sua fase de normalidade, logo celebrando alegremente o retorno a ela, em algumas semanas de degradação, na qual se apresenta a manifestação maníaco-depressiva, em que aparecem os episódios delirantes.

Não se pode negar que existe uma herança ancestral para o alcoólico. Descendente de um viciado, ele apresenta tendência a seguir o hábito doentio. Igualmente há outros fatores orgânicos, como lesões nervosas, encefalopatias, traumatismos cranianos. Do ponto de vista psicológico, podem ser instaladas como causas, os conflitos de qualquer natureza, especialmente sexuais, empurrando para o vício destruidor. A timidez, a instabilidade de sentimentos, o ciúme, o complexo de inferioridade, os transtornos masoquistas propelem para a ingestão de substâncias alcoólicas como fugas das situações embaraçosas. Algumas vezes, para servirem de encorajamento e outras com a finalidade de apagar lembranças ou situações desagradáveis.

Sob qualquer aspecto considerado, porém, essas situações apresentam-se mediante altas doses de mau humor e de agressividade, derivadas dos tormentos íntimos do paciente, que não foram acalmados.

O dependente alcoólico é portador de compromissos espirituais transatos muito grandes, à semelhança de outros enfermos. No caso específico, há um histórico anterior, em experiência passada, quando se entregou às dissipações, especialmente de natureza etílica, assumindo graves compromissos perturbadores com outros Espíritos, que lhe padeceram as injunções penosas e que o não perdoaram. Reencontrando-o, estimulam-no à antiga debilidade moral, a fim de o consumirem na alucinação, ao tempo em que também participam das suas libações, dando prosseguimento aos desaires que a ausência do corpo já não lhes permite.

À semelhança do que ocorre com o tabagista e o drogado, estabelece-se um conúbio vampirizador por parte do desencarnado, que se torna hóspede dos equipamentos nervosos, via perispírito, terminando por conduzir o paciente ao delirium tremens, como resultado de insuficiência supra-renáltica, quando o organismo exaurido tomba sob situações de hipoglicemia e hiponatremia.

Noutras vezes prosseguem na desforra, em razão do sentimento ambíguo de amor e ódio, no qual satisfazem-se com as aspirações dos vapores etílicos que o organismo do enfermo lhes proporciona e do ressentimento que conservam embutido no desejo de vingança.

Assim sendo, igualmente entorpecem-se, embriagam-se, pela absorção da substância danosa que o perispírito assimila, enlouquecendo, além do estado infeliz em que se encontram. Nessa situação, tomam da escassa lucidez do hospedeiro psíquico e emocional, ampliando-lhe o quadro alucinatório e levando-o à prática de atos abjetos e mesmo de crimes hediondos.

A questão é tão grave e delicada, que nem sequer a desencarnação do obsidiado faz cessar o processo que, não raro, prossegue sob outro aspecto no Mundo espiritual.

O vício, de qualquer natureza, é rampa que conduz à infelicidade.

Prejuízos físicos, mentais e morais do alcoolismo

Considerando-se a falta de estrutura dos valores éticos na sociedade hodierna, determinados comportamentos que deveriam ser considerados como exóticos, quando não perturbadores e censuráveis, assumem respeitabilidade e passam a constituir-se modelos a serem seguidos pelas personalidades dúbias.

O alcoolismo é um desses fenômenos comportamentais que, desde priscas eras, vem atormentando o ser humano.

A criança e o jovem ambientados ao clima vigente, por imitação ou estimulação de outra natureza qualquer, aderem às libações alcoólicas, procurando ser semelhantes aos outros, estar no contexto geral, demonstrar aquisição de identidade e de liberdade pessoal...

Os danos que decorrem desse hábito infeliz são incalculáveis para o indivíduo e para a sociedade, assim como os prejuízos de vária ordem, inclusive econômicos, para as organizações governamentais de saúde.

A intoxicação apresenta-se sob dois aspectos: aguda, ou embriaguez e crônica. Não existe uma linha demarcatória entre ambas, podendo estar combinadas, o que ocorre na maioria das vezes. A embriaguez é de duração breve no seu aspecto clínico. No entanto, pode evoluir, passando por três fases: excitação, depressão e coma. Na primeira, surge a euforia, como mecanismo de libertação de conflitos emocionais reprimidos durante a abstinência. É de duração breve, relativamente entre uma hora e meia e duas horas. É muito conhecida como vinho alegre. A depressão, também chamada vinho triste, ocorre a seguir ou pode surgir de maneira inesperada, de chofre. O paciente entrega-se ao desmazelo, ao abandono, movimenta-se trôpego, trêmulo, numa espécie de ataxia física e mental. Oscila entre a tristeza e a alegria, apresentando sudorese abundante, náuseas, vômitos...

Logo depois, advém um torpor, uma espécie de sono com estertores, que se apresenta em forma do coma da embriaguez. Nessa fase, pode ocorrer a desencarnação resultante de algum colapso cardíaco.

Surgem também, manifestações diferenciadas em forma sensorial, afetiva e motora, que se podem fundir em uma situação lamentável.

Os sentidos físicos ficam afetados, os estados oníricos tornam-se tormentosos, as alucinações fazem-se frequentes.

Cada uma dessas formas de embriaguez tem a sua característica sempre degradante para o paciente, que perde completamente o controle da razão, da emoção e do organismo físico, no qual instalam-se problemas de alta gravidade.

Também é conhecida a embriaguez simples ou excitação ebriosa, na qual o paciente pode apresentar-se de forma expansiva ou depressiva, de acordo com a sua constituição emocional. Na situação, sem controle sobre as inibições, desvela-se, e, em face da libertação, pode tornar-se vulgar, agressivo, ultrajando as pessoas, agredindo os costumes, derivando para diversos tipos de crimes contra o cidadão, o patrimônio...

Lentamente o paciente começa a sofrer perturbações intelectuais e de memória, embotamento dos sentimentos e distúrbios de conduta. Além desses desequilíbrios, a face apresenta-se pálida e de expressão cansada, a língua saburrosa, hepatomegalia, febre, facilidade para permitir-se infecções, como gripe, erisipela, pneumonia.

Quando irrompe o delirium tremens o paciente encontra-se em fase adiantada de alcoolismo, com impossibilidade imensa de retornar à sanidade, ao equilíbrio, em razão dos distúrbios profundos nos sistemas nervoso central, neurovegetativo, simpático e parassimpático, além das disfunções de outros órgãos que se encontram afetados pelo excesso de álcool: fígado, rins, pâncreas, estômago, intestino, coração...

Noutras vezes, o paciente é conduzido à demência alcoólica, em decorrência do enfraquecimento generalizado de todas as funções psíquicas, particularmente as intelectuais, ao tempo em que é atingido na afetividade e na moralidade.

Nessa fase, a morte é quase iminente, pois as funções orgânicas exauridas já não podem manter-se em ritmo de trabalho equilibrado, cedendo lugar ao descontrole e à exaustão.

Pode acontecer que, em muitos pacientes crônicos, antes da ocorrência dos acidentes delirantes subagudos, surjam estados neurasteniformes, caracterizados pela fadiga, por dores esparsas, astenia muscular, perturbações digestivas, cefaléia... Por extensão, o sono é assinalado por confusão mental e inquietação, produzindo mal estar e aumentando o cansaço pela falta do repouso que se faz necessário à manutenção da maquinaria orgânica.

A verdade insofismável, é que o alcoólico é um paciente que apresenta grande dificuldade de aceitação terapêutica, por estar escamoteando sempre os tormentos sob justificações, ora acusatórias como de responsabilidade daqueles que lhes criam situações difíceis, ou como de vítimas das circunstâncias, que dizem poder reverter, quando quiserem, que nunca o conseguem.

Tratamento do Alcoolismo

Em face da gravidade do alcoolismo, são necessários recursos psiquiátricos, psicológicos e orientação social, a fim de auxiliar o paciente na recuperação da saúde.

De acordo com a extensão de cada caso, é sempre recomendável a orientação psiquiátrica, com o conveniente internamento do enfermo, a fim de auxiliá-lo na desintoxicação, naturalmente acompanhada de cuidadoso tratamento especializado.

Nessa fase, sempre pode ocorrer o colapso em defluência da falta do álcool no organismo. À medida que vai sendo recuperada a lucidez, a ajuda psicológica é de grande valor, por facilitar a identificação das causas subjacentes e que se encontram inibidas, como efeito de uma infância mal vivida, frustrada ou de reminiscências inconscientes – clichês mentais inesperados – pertinentes às experiências malogradas em existências anteriores...

A boa leitura certamente propicia o despertamento da consciência para a nova situação, demonstrando que a realidade não é tão agressiva conforme se crê, dependendo de cada um na sua forma de enfrentá-la.

A aplicação da bioenergética é de grande utilidade, porque robustece o ânimo do paciente e ajuda-o na libertação das tenazes que sofre por parte do perseguidor desencarnado.

Graças a esse recurso, torna-se mais fácil a mudança de comportamento para outra faixa vibratória, mais elevada, favorecendo o fortalecimento moral e espiritual através da oração, por cuja terapia passa a sintonizar com outras mentes mais nobres e a captar a presença dos Guias espirituais que são atraídos e o auxiliarão na conquista do seu reequilíbrio.

A psicologia e a psiquiatria espíritas conseguiram demonstrar que existe uma outra realidade além da objetiva, da convencional, na qual  ávida é estuante e apresenta-se em forma de causalidade, onde tudo se origina e para a qual tudo retorna.

Dessa forma levantaram o véu que dificultava a visão do mundo espiritual existente e desconhecido,vibrante e gerador de fenômenos que se apresentam na esfera física, antes não entendidos e considerados miraculosos, desbordando em fantasias e mitos, ora fascinantes, ora aterradores...

A confirmação da imortalidade do Espírito facultou o entendimento em torno das relacoes que existem entre as duas esferas da mesma vida, ensejando a compreensão da finalidade do processo reencarnacionista, assim proporcionando sentido e significado especial à existência corporal.

Desse modo, importante é o ser, em si mesmo, portador de possibilidades quase infinitas na sua trajetória, dependendo sempre da sua eleição pessoal em torno da busca da plenitude.

Enfermidades, desaires, sofrimentos, alegrias e esperanças fazem parte do trajeto a percorrer, nunca esquecendo que a cada passo dado uma nova conquista se insere no equipamento de realizações enobrecedoras. Eis por que a jornada humana deve caracterizar-se pela visão e pela ação positivas, no incessante labor de auto-realização para melhor contribuir em favor da coletividade da qual faz parte.

A cura real, portanto, de qualquer paciente, reside na sua transformação moral para melhor, porquanto pode recuperar a saúde física, emocional e mesmo psíquica, no entanto, se não aceitar a responsabilidade para auto-iluminar-se, logo enfrentará novos problemas e situações desafiadoras. Essa reabilitação deve dar-se, por certo, do interior para o exterior, dos sentimentos para a organização fisiológica.

Tendo em vista a presença da morte e da imortalidade, convém ter-se sempre em mente que a cura lograda, por mais ampliação de tempo que conceda, não impedirá o inevitável fenômeno da morte que acontecerá...

domingo, 28 de agosto de 2016

TABAGISMO

Causas do Tabagismo

O cultivo dos hábitos saudáveis, considerados como virtudes morais, oferece o bem estar gerador de harmonia pessoal e social. Eles contribuem decisivamente para o equilíbrio orgânico, emocional e psíquico, facultando uma existência realmente prazerosa.

Esses hábitos proporcionadores de felicidade insculpem-se no cerne do ser e ajudam-no a conquistar o processo de auto-realização.

Entre os mais expressivos e edificantes, em toda a sua grandeza destaca-se  a superação do egoísmo através da prática do bem com total desinteresse, definindo o biótipo espiritual triunfador.

Sob outro aspecto, os hábitos viciosos atormentam, desenvolvendo ou ampliando conflitos que entorpecem o indivíduo, enfermando-o, desarticulando-lhe as resistências morais.

Certamente, há aqueles que se afeiçoam com facilidade aos bons costumes e vivenciam-nos com relativa facilidade, em razão de se haverem exercitado em existências anteriores, enquanto outros que tombam na dependência viciosa, estão iniciando-se ainda na experiência da luta para adquirir imunização ao seu contágio.

Os hábitos de qualquer procedência são resultados da dinâmica de manutenção do exercício, mediante a afinidade com este ou aquele, seja possuidor de benefícios ou de aflições.

Quanto mais se repetirem as tentativas e ações mais serão fixadas no comportamento, tornando –se uma denominada segunda natureza.

Os vícios, pois, decorrem da acomodação mental e moral a situações penosas e equivocadas, que exigem esforço para salutar direcionamento, mas que, a falsa sensação de prazer transforma-se em desar ou aflição, logo que fruída.

Entre os denominados vícios sociais destaca-se o tabagismo de consequências danosas para o organismo físico do dependente na nicotina e dos demais conservantes do fumo, bem como gerando transtorno de emoção.

De duas ordens são as causas do tabagismo: a primeira delas, de natureza subjetiva, porque incita no emocional do indivíduo, apresentando-se sob variado elenco de manifestações, tais como a timidez e o medo, o complexo de inferioridade e insegurança, a baixa estima pessoal e a ansiedade, que resultam de processos anteriores da evolução ou que ressumandos conteúdos psíquicos inconscientes arcaicos e infantis do fumador.

Nessa situação, é fácil a busca do bastão psicológico de sustentação, no caso em tela o tabaco para mascar ou fumar, mais genericamente em forma de cigarro, charuto ou cachimbo, que é queimado, tendo tragada a sua fumaça.

Sob o ponto de vista psicanalítico, conforme Freud, durante o período de desenvolvimento oral na criança, toda vez que esta apresenta qualquer necessidade e chora, logo recebe a chupeta, a amamentação, o dedo na boca, as guloseimas, indo repetir-se este fenômeno na idade juvenil e adulta, quando se busca o tabaco na sua forma social e elegante, para restituir a tranquilidade, vencendo aparentemente a ansiedade.

Aquela fase oral do desenvolvimento infantil grava-se no inconsciente, nos seus aspectos positivos e negativos, representando a gratificação que os pais e os familiares oferecem ao bebê com o objetivo de deixá-lo feliz.

Desse modo, na juventude, o cigarro especialmente torna-se o consolo ante as incertezas, os desafios e o apoio psicológico para os temores de enfrentamento em relação à angústia e especialmente à solidão. Nesse período de incertezas da existência, o jovem experimenta muita ansiedade e sofre grave insegurança, acreditando que, no fumo, irá encontrar os valores que lhe faltam no momento, assim tombando no vício.

Indispensável, desse modo, entender-se a oralidade, a fim de resguardar-se da fuga para o tabagismo.

A segunda é de natureza objetiva, social, externa, defluente da convivência com outros dependentes da nicotina, que fingem haver adquirido a independência (dos pais, dos familiares, dos mestres), afirmando a personalidade, adentrando-se na sociedade dos adultos, igualmente viciados...

Receando ser discriminado no grupo em que se movimenta, por não proceder de maneira idêntica (relacionamentos-espelho, que os indivíduos refletem-se na conduta uns dos outros), o jovem ou mesmo o adulto, permite-se a iniciação, nem sempre muito agradável, logo parecendo capaz de afirmar-se perante os demais, já que não tem convicção das próprias possibilidades, tornando-se dependente do vício.

As pressões sociais e emocionais, os incontáveis embates do crescimento como ser inteligente, quando produzem ansiedade e geram inquietação, empurram o incauto para o recurso do bastão psicológico de apoio, com a finalidade enganosa de tranqüilizar e inspirar soluções.

Também são sugeridas outras espécies de causas, como sejam: a voluntária, pelo excesso de fumo ou de mastigação do tabaco e a profissional, que atinge os trabalhadores dessa indústria perversa.

Dependentes das substancias absorvidas pelo uso do tabaco, alguns desses tipos psicológicos frágeis crêem que a ingestão do álcool, mesmo que em doses mínimas, propicia inspiração, qual ocorre no período da sesta em favor da criatividade, e buscam esse estímulo morbífico.

A criatividade, a inspiração, o êxtase legítimo, decorrem da perfeita lucidez, num período de bem-estar e de integração com o Cosmo, após o esforço da busca para o encontro, facultando ao subconsciente ou ao pré-consciente o auxílio necessário e eficaz.

Nesse comportamento, atinge-se com relativa facilidade o estado alterado de consciência, ao invés de mergulhar-se em estados de consciência alterada pela ingestão de substâncias alucinógenas, portadoras de danos imprevisíveis ao cérebro e aos respectivos departamentos emocional e psíquico do usuário.

Assim, o êxtase deve ser alcançado mediante perfeita sintonia com as faixas sutis da vida, sem a intoxicação resultante de qualquer substância vegetal ou química.

Quando ocorre a transcendência temporária na dicotomia sujeito-objeto, dá-se o êxtase, sem qualquer conotação neurótica ou pejorativa, ou ainda, regressão a serviço do ego.

Será sempre nesse estado de perfeita afinidade que sucede, facultando o abandono do ego e suas injunções para a harmonia com o self numa outra dimensão espaço-tempo.

Os vícios, sejam de qual constituição se apresentem, tornam-se cadeias escravizadoras de consequências lamentáveis para os seus aficionados.

Melhor, portanto, evitar-lhes a instalação do que a posterior luta pela sua superação.

Instalação e Danos da Dependência Viciosa

Iniciada a experiência desastrosa, sempre que haja qualquer tipo de conflito, de ansiedade, de insegurança, o paciente busca o recurso do tabaco na vã ilusão de alcançar os resultados do bem-estar, da serenidade.

À medida que o organismo intoxica-se aumenta o índice de necessidade, passando à dependência coercitiva e perturbadora. Simultaneamente aparecem os sinais que tipificam os danos causados ao organismo, que podem vir a sós ou associados uns aos outros.

O tabagismo é responsável, portanto, por diversas enfermidades, especialmente as do sistema nervoso centras, como dos aparelhos cardiovascular, respiratório, digestivo e das glândulas endócrinas, com perturbações da fala, acidentes de estenocardia e dos vasos periféricos. Na sua fase aguda, surgem as náuseas, vômitos, desmaios, dores de cabeça, fraqueza nas pernas, sialorréia...

Na ocorrência da insuficiência coronária e bronquite crônica, nas dispepsias gástricas e biliar, diabetes, o tabagismo piora os quadros, levando a desenlaces dolorosos e inevitáveis.

O fumante pensa haver conseguido ganhos com o hábito danoso, como por exemplo fazer parte do círculo de dependentes, sentindo-se aceito e idêntico, especialmente na fase das conquistas amorosas quando o outro – masculino ou feminino – é viciado.

A ampla divulgação pela mídia de que o fumador é um indivíduo triunfante, conquistador invejável e realizador de façanhas poderosas, contribui para que as personalidades conflitivas busquem o tabaco, a fim de alcançarem realização semelhante. Infelizmente, a mídia não apresenta os seus modelos, quando estão sendo devorados pelo câncer que resulta do hábito inveterado de absorver nicotina em altas doses...

A ilusão proporcionada pelo tabagismo é paradoxal: inicialmente parece que acalma, que dá vitalidade, no entanto, quanto mais a vítima se deixa arrastar pelo uso doentio, mais neurótica, mais insegura e mais instável apresenta-se.

O indivíduo fármaco-dependente atinge um nível de transtorno de tal monta, que se sente incapaz de enfrentar qualquer tipo de atividade sem o apoio do cigarro, muitas vezes mesmo antes de qualquer refeição, a fim de iniciar o dia.

Quando tenta evitar-lhe o uso, e casualmente o anseio da ação não corresponde ao esperado, logo supõe que é a falta do cigarro que se faz responsável pelo que considera insucesso e recorre-lhe ao apoio, reabastecendo-se de ânimo e formando o círculo vicioso.

Mesmo quando o dependente reconhece os danos que o vício vem-lhe causando ao organismo, teme abandoná-lo, embora o deseje sem grande esforço, prosseguindo, porém, vitimado nas suas garras.

O eminente psiquiatra Sigmund Freud, já referido, denomina esse fenômeno como a pulsão de morte, ou seja, a maneira mórbida como a pessoa deixa-se arrastar pelas condutas doentias e destrutivas.

Fenômeno especial ocorre nessa como em qualquer outra dependência viciosa, que é a presença de Espíritos igualmente enfermiços que se utilizam do paciente para a convivência obsessiva, dando prosseguimento aos hábitos infelizes em que se compraziam e ora sentem falta, em face da ausência da organização física.

Assim, estabelecem-se ligações mórbidas, ensejando processos de vampirização que se fazem mais complexos, quando utilizam dos vapores etílicos, das emanações do tabaco, das drogas, para continuarem comprazendo-se.

Essa ingerência mais agrava o estado do paciente físico, porque, mesmo usando a bengala psicológica, prossegue frustrado, em razão do desvio daquelas substancias que lhe pareciam auxiliar quando em tormento.

À medida que a parasitose espiritual mais se aprofunda no comportamento do encarnado, este sente-se ainda mais enfraquecido, aturdido e infeliz, esvaziado de ideiais de superior significação.

Toda vez quando pensa em abandonar o vício tem a mente invadida por pavores e ameaças não verbalizadas, que mais o afligem e o atiram no vazio existencial.

O existencialista francês Jean Paul Sartre sugeriu que se desvestisse o tabaco de qualquer significado especial, reduzindo-o à questão de uma erva que arde e se consome, não merecendo por isso mesmo qualquer outra conotação.

Dá-se, porém, o oposto, porque o viciado olha-o com enorme expectativa, a ponto de transformá-lo em sua tábua de salvação, guardando o último cigarro com verdadeira volúpia, quando escasseiam em suas mãos, a fim de que, no momento da angústia, que já formula inconscientemente, disponha do mecanismo de apoio e de liberação do mal-estar.

O lamentável, em todo esse processo, é que além dos males proporcionados pelo tabagismo à vítima, alcança as pessoas que ao seu lado se encontram, porque as obriga a aspirar o fumo perverso que espalha, intoxicando-as também. Não poucas vezes, aqueles que se expõem às emanações do cigarro ficam impregnados de tal forma, que se enfermam, apresentando sintomas típicos de usuários do produto destrutivo.

A cultura do cigarro, do charuto e do cachimbo em nossa sociedade dita civilizada, faz parte dos grandes mecanismos inconscientes de fuga da realidade para a fantasia, para o exibicionismo, para auto-realizações equivocadas.

Dando-se conta dos prejuízos que já experimenta expressiva massa de fumantes, muitos procuram fórmulas mágicas para libertar-se do vício e tentam os recursos de ocasião que aparecem com certa periodicidade, sem que, de fato, desejem pagar o alto preço pela abstinência do fumo.

Assim, param por algum tempo, e à medida que vão sendo vítimas da síndrome dela decorrente, apresentam-se irritadiços, depressivos, impacientes, sofrendo interrupção do sono, confusão mental, insatisfação, retornando prazerosamente ao hábito consumista e extravagante.

Assevera-se que determinado famoso escritor, crítico literário irlandês, afirmou com certa dose de ironia: Deixar de fumar é fácil. Eu já o deixei inúmeras vezes...

Qualquer hábito para ser liberado do indivíduo que lhe aceita a injunção, deve ser substituído por outro, de forma que não surja o vazio, a ausência de algo que parece importante, em face de se estar acostumado à sua presença.

Terapia para a Cura

Da mesma forma como se instalou o vício, a sua libertação ocorre mediante um processo semelhante e de prolongado curso.

Os danos causados, quase sempre são irreversíveis, sendo alguns ainda em início, possivelmente diminuídos com a ausência da nicotina.

A denominada compensação do fumante – apresentar a carteira de cigarros, retirá-la de coberturas de luxo, a postura exibicionista – cria dificuldade quando ele se resolve por abandonar o hábito. Naturalmente a falta do mentiroso prazer que está arraigado no seu comportamento, gera-lhe algumas perturbações, que se prolongarão enquanto dura a intoxicação.

Uma postura psicológica deve ser levada em conta inicialmente: a maneira como se vai libertar, a fim de ser um ex-fumante e não alguém que deixou de fumar – uma forma de perda – desejando realmente alcançar o êxito, porquanto ele já sabe que deve parar, a fim de que realmente deseje parar.

É necessário, desse modo, uma mudança de comportamento, na qual o paciente deve possuir uma clara percepção da sua ansiedade, aprendendo a superá-la, vencendo-a sem o uso do tabaco.

Essa mudança de comportamento propõe varias etapas, nas quais o paciente vai se adaptando a cada uma delas, no curso do seu processo de cura, evitando criar outros hábitos, como o uso de caramelos e pastilhas, de substitutivos placebos...

O desejo real deve ser mantido pelo pensamento radicado na lógica e no anelo de uma existência saudável, na qual os valores pessoais disponham-se a superar as dificuldades do estágio em que se encontra.

A aplicação de tempo e de energia nessa mudança que deverá ser durável, não lhe deve permitir recidivas experimentais de que apenas uma só vez será bastante para acalmar-se quando em aflição, desse modo, reiniciando o vício.

Só então começam a surgir as vantagens, os resultados bons da decisão, quando a mente apresenta-se mais clara, o organismo, mesmo em fase de eliminação dos tóxicos, tem respostas melhores e mais rápidas, o sono faz-se mais tranqüilo e o bem estar instala-se a pouco e pouco.

O estímulo para ser um ex-fumante contribui para ganhos emocionais e não perdas, alcançando um novo patamar de vida, o estimulo de uma vitória sobre si mesmo, a alegria de haver conseguido o que muitos outros ainda não se resolveram por alcançar, facultando vantagens psicológicas compensadoras.

Simultaneamente, a ajuda psicoterapêntica de um especialista, a fim de acompanhar o procedimento que irá restituir a saúde e a paz, torna-se fator essencial para o êxito que se deseja conseguir...

Como corolário da decisão, o paciente deve buscar as Fontes Generosas da Espiritualidade por intermédio da oração e da concentração, a fim de receber os fluxos de energia renovadora para a manutenção da estabilidade dos propósitos abraçados.

Mantendo a vigilância de que é um paciente em contínuo tratamento, cabe-lhe evitar qualquer possibilidade de cedência ao vício, não lhe aceitando os desafios subliminais que atingem a todos que se encontram na fase de transformação.