sábado, 25 de julho de 2015

Seleção e privacidade

 Privacidade, não se admitindo no local e horário para o intercâmbio mediúnico senão a equipe responsável, exceção feita para algum convidado em condições de assisti-lo, a critério do dirigente.

No item 330 de O Livro dos Médiuns, Allan Kardec chama a atenção que não apenas a qualidade dos médiuns determina a qualidade de uma reunião, esclarecendo que as influências de todos os assistentes repercutem nela, conforme estudara anteriormente, quando tratou da influência do meio.

Não seria, portanto, de estranhar-se o seu empenho, quando da composição do Estatuto da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, no sentido de dotá-la de normas seguras e capazes de proteger as suas reuniões experimentais contra a infiltração de elementos desinformados, curiosos ou antagônicos, conforme se nota nos artigos 3°, 4° e 17°, este último sumariamente proibindo as sessões mediúnicas públicas.

Ao contemplar a possibilidade de ouvintes, o referido Estatuto estabelece, no artigo 22, que esses seriam aceitos somente quando simpatizassem com os trabalhos da Sociedade e já estivessem suficientemente iniciados na ciência espírita para compreendê-los.
Os critérios de Allan Kardec podem ser percebidos melhor na prática, através dos diálogos que simula em O Que é o Espiritismo. No primeiro, ele enfrenta um crítico sistemático, de má vontade, empenhado a mais não poder na tentativa de obter permissão para assistir a algu­mas reuniões. Obviamente que o Codificador não se dobra, negando aquilo que seria uma concessão indébita, para, no final, expor sua tese, enfeixada na seguinte recomendação: - Instrua-se primeiro pela teoria.

No segundo diálogo, Allan Kardec se depara com um céptico, apenas desinformado, embora portador de honestas dúvidas e objeções para as quais buscava respostas convincentes. De saída, o Codificador adverte-o de que não tinha pretensão de poder responder a todas as questões - o que, aliás, seria impossível no espaço de uma entrevista - colocando-se à disposição para os esclarecimentos ao seu alcance.

Salta aos olhos a profunda diferença de traços psicológicos entre os dois interlocutores de Allan Kardec. O primeiro - o crítico - é o que o Codificador chama de incrédulo por sistema, materialista de má-vontade e por interesses escusos; não está maduro para o ensino espiritual. O segundo - o céptico - é o incrédulo por ignorância que só precisa que lhe retirem a venda dos olhos. O seu caráter habilita-o para o ensino. Tanto assim o é que Allan Kardec acolhe-o com interesse de irmão e mestre. O diálogo começa ameno e termina com uma pessoa convencida e entusiasmada conquanto não convertida. Mesmo assim o professor Rivail mantém a sua tese sustentando a necessidade de preparação. Acena-lhe, todavia, com a possibilidade alvissareira de vir a ser um ouvinte (não necessariamente de imediato) propondo-lhe o estudo da Doutrina que, em verdade, ali mesmo inicia com as 37 questões basilares de Doutrina Espírita de que se compõe a entrevista. É nesse diálogo que está a tão repetida expressão do mestre lionês:
As comunicações de além-túmulo cercam-se de maiores dificuldades do que geralmente se crê: não estão isentas de inconvenientes e perigos para os que não têm a necessária experiência. Sucede o mesmo a quem se mete a fazer manipulações químicas, sem conhecer a química: corre o riscode queimar os dedos... (grifos nossos).
O pensamento de Allan Kardec em O Método (O Livro dos Médiuns, 1ª Parte, cap. III) encerra a questão:

O melhor método de ensino espírita consiste em se dirigir antes à razão do que aos olhos...
Os que crêem antes de haver visto, apenas porque leram e compreenderam, longe de se conservarem superficiais, são, ao contrário, os que mais refletem.

A inteligência prévia dos fatos não só as coloca (as pessoas) em condições de se aperceberem de todas as anomalias, mas, também, de apreenderem um sem-número de particularidades, de matizes, às vezes muito delicados, que escapam ao observador ignorante. Tais os motivos que nos forçam a não admitir, em nossas sessões experimentais, senão quem possua suficientes noções preparatórias para compreender...

Comungam com o pensamento do Codificador, León Denis (No Invisível, Primeira Parte, cap. IX), Manoel Philomeno de Miranda, (Nas Fronteiras da Loucura, cap. 16) e a totalidade dos Espíritos nobres vinculados à divulgação espírita em nossa terra, além da maioria dos experimentadores encarnados comprometidos com o ideal da Doutrina Espírita.
Esses critérios se aplicam ao exercício mediúnico de responsabilidade grupal e solidária. Naturalmente que, médiuns há, e sempre os houve, comprometidos por força de um programa reencarnatório a trabalharem a mediunidade dentro de um enfoque de maior liberdade, para fins exclusivos de provarem a sobrevivência, justificando, destarte, uma atuação mais voltada para o público.

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