Por Ivan
Paulo Salgado
Allan
Kardec em “O Livro dos Espíritos“, na seção "Paixões" do capítulo
"Da perfeição moral" pergunta “Será intrinsecamente mau o princípio
originário das paixões, embora esteja na Natureza?”.
É
Importante notar que, primeiro, Kardec indaga acerca do princípio originário
das paixões, e não delas próprias, ou seja, procura esclarecimento sobre a
origem, a fonte de onde nascem as paixões. Segundo, há na pergunta uma
afirmação categórica, o princípio do qual provêm às paixões está na Natureza,
isto é, faz parte da ordem natural das coisas. Terceiro, o livro trata todas as
paixões, como paixão pelo dinheiro, paixão por futebol e etc. Enquanto o foco
aqui é a paixão por uma pessoa, paixão amorosa.
O conceito
ordinário de paixão traz consigo uma conotação negativa, associando paixão a
desequilíbrio, tumulto emocional ou desvios patológicos do sentimento.
Frequentemente se ouve frases como “Isto não é amor, é paixão”, ou “Fulano está
cego de paixão”. A questão proposta por Kardec motiva-se exatamente pelo
conflito entre essa acepção vulgar do termo paixão e a análise filosófica das
paixões, que indica serem elas provenientes de causas naturais. Considerando
que tudo aquilo que pertence à ordem natural obedece a uma sabedoria e a uma
bondade supremas, tendo, em outras palavras, sido instituído por Deus.
Está
implícito na afirmação de Kardec de que o princípio originário das paixões é
bom, tendo sido "posto no homem para o bem". O mal que vulgarmente se
associa às paixões é o resultado de uma distorção do sentimento original. Do
contexto é justo depreender que essa distorção corre por conta do livre
arbítrio humano na condução de seus sentimentos, não podendo ser imputada à
fonte natural e neutra de onde provêm.
Para
Kardec as paixões são como um corcel que tem utilidade quando governado e
perigoso quando se perde o controle dele. Uma paixão se torna perigosa a partir
do momento em que se perde o poder de governá-la, o que resulta em prejuízo
qualquer para si, ou para outrem.
O
Espiritismo modificou e complementou a descrição da paixão sem atribuir-lhe um
automatismo total, centrado na estrutura fisiológica, mas dando residência as
paixões no próprio espírito, em sua existência que antecede e sucede à do corpo
denso, com possíveis influências também do seu envoltório perisspiritual.
Ainda, segundo o Espiritismo, se constata por observação direta que os
Espíritos desencarnados continuam tendo sentimentos aparentemente semelhantes
às nossas paixões. Isso indica que a causa imediata das paixões não se pode
reduzir a processos referentes ao corpo denso. O fato de que diante de
determinados estímulos externos ou internos a alma é automaticamente objeto
daqueles sentimentos que chamamos paixões deve-se a uma faculdade inerente à
própria alma, que tem uma razão de ser providencial.
Pelas
investigações científicas dos fenômenos espíritas, conhecemos inúmeros fatos e
leis da realidade espiritual. É indubitável que alterações diversas do corpo,
especialmente do sistema nervoso, podem de fato fazer surgir sentimentos ou
paixões na alma. No entanto, sabemos que em muitas ocasiões em que não
encontramos sua causa última naquilo que explicitamente observamos, quer no
mundo exterior e em nossos corpos, quer em nossa alma, deve-se a fatores
espirituais, tais como as vivências no mundo espiritual durante o sono, as
influências obsessivas e telepáticas de um modo geral, ou a volta parcial de
nosso passado (outras reencarnações).
Ainda
no Livro dos Espíritos, (questões 907 e 908), Kardec afirma que as paixões
"são alavancas que decuplicam as forças do homem e o auxiliam na execução
dos desígnios da Providência". À primeira vista, é fácil reconhecer que o
amor provém de princípios bons e concorrem para o nosso bem.
Importante
pontuar que essa visão é bem formal uma vez que se fundamentou a discussão no
livro-base do Espiritismo. Outro ponto é que estamos falando de paixão como um
bom sentimento e não de "obsessão amorosa", que, segundo o
Espiritismo, é causada por espíritos inferiores que tem prazer em praticar o
mal.
* KARDEC, A. Le Livre des Esprits. Paris, Dervy-Livres, s.d. (dépôt légal 1985). (O Livro dos Espíritos. Trad. Guillon Ribeiro, 64a ed., Rio de Janeiro, Federação Espírita Brasileira, s.d.)
Grato pelo esclarecimento!!
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